De Dona Constança, entretanto falecida, D. Pedro tem um legitimo herdeiro ao trono. D. Fernando. De Inês, D. Pedro tem três bastardos. O rei, D. Afonso IV, e a nobreza temem que algum dos bastardos possa, futuramente, querer impugnar a legitimidade de D. Fernando. Uma possibilidade considerada por todos perigosa para o reino. Por outro lado, os Castros, irmãos de Inês, pressionam D. Pedro quanto aos seus direitos sobre o trono de Castela. Em 1354, D. Pedro terá mesmo aceite a sugestão. Só por pressão de seu pai suspende a intenção de lutar pela coroa de Castela. Os nobres temem que D. Pedro acabe por arrastar Portugal para as lutas dinásticas do reino vizinho. É, neste contexto, que a nobreza alvitra o rei de que só com a morte de Inês de Castro poderá livrar o Príncipe de tão funesta influência – a dos Castros. Pêro Coelho, nobre com influência na corte e alcaide do Jarmelo, está entre os maiores defensores desta tese, que em 1355 seria decidida em Montemor-o-Velho.
(Segundo conta a lenda, D. Pedro encontrava-se a caçar numa coutada nas colinas jarmelistas, quando os pastores o informam de que Inês, raptada, estaria cativa na Vila do Jarmelo. Diz a lenda que, numa bela noite, cavalgando um cavalo negro com as ferraduras pregadas ao contrário, envolto numa capa negra, D. Pedro raptou Dona Inês e acabaram por fugir).
A sentença determinou a morte de Inês (Garcia de Resende põe Inês de Castro a clamar: «(…) Olhe bem quanta crueza / Fará nisto Vossa Alteza, / E também, Senhor, olhai, / Pois do príncipe sois pai, / Não lhe deis tanta tristeza. (…)» Confrangido, Afonso IV retira-se, deixando nas mãos de Diogo Lopes Pacheco, Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves a execução. E os nobres decidem degolar Inês. O palco escolhido foi a Quinta das Lágrimas, perto de Coimbra. Vence a razão de Estado, morre a do afecto…
D. Pedro revolta-se contra o pai. Afonso IV chama-o à razão e, com a ajuda do Bispo de Braga, consegue apaziguar a desavença. O rei exige que Pedro não persiga os matadores. Este promete perdão, mas a vingança só ficou adiada. Quando em 1357 o rei morre, D. Pedro vinga a morte da amada. Persegue os nobres assassinos. Diogo Lopes Pacheco consegue fugir para França, mas Álvaro Gonçalves e Pêro Coelho são capturados. A um é arrancado o coração pelas costas, a outro pelo peito.
Não ficou por aí a sede de vingança de Pedro. O príncipe, agora rei, ordenou que a vila do Jarmelo fosse arrasada por ser a naturalidade de Pêro Coelho, «não ficando pedra sobre pedra», conta a lenda. Mais: mandou salgar as terras à sua volta para não poderem ser cultivadas. Enquanto as casas ardiam, a população fugiu para as redondezas, não mais regressando à vila. Muitos aproveitariam depois as pedras para construir as casas em alguma das 14 anexas que nasceram nas encostas do Jarmelo. A Vila desapareceu. Para sempre!
Em 1361 D. Pedro mandou trasladar os restos mortais de D. Inês, do Mosteiro de Santa Clara para o de Alcobaça. Comenta-se que aproveitou então para coroar Inês e que obrigou os nobres a beijar a sua mão. Cenário dantesco que faz parte de uma lenda perpetuada pelo povo do Jarmelo. Camões assevera-o: «As obras com que Amor matou de amores / Aquele que depois a fez Rainha (…)».
No Mosteiro de Alcobaça, D. Pedro tinha mandado esculpir dois túmulos, um para Inês, outro para si próprio. Colocados lado a lado, viriam a ser os grandes expoentes da arte tumular medieval portuguesa. Os baixos-relevos do túmulo de Dona Inês representam cenas da vida de Jesus, da Ressurreição e do Juízo Final. Sobre a tampa está esculpida a imagem de Inês, de corpo inteiro, com coroa na cabeça como se fora rainha. As esculturas do túmulo de D. Pedro representam cenas da vida dos dois apaixonados desde a chegada de Inês a Portugal. D. Pedro morreu em 1367, em Estremoz.
O mito do amor de Inês e Pedro perpassa toda a nossa história. Um mito que se conta juntando lenda e história.
Luís Baptista-Martins