Há dias, numa caixa de comentários a uma notícia sobre Barack Obama, alguém escreveu alguma coisa como: «Não foi este o tipo que aumentou brutalmente o défice dos EUA?». É mentira, como é mentira que os benefícios do “Brexit” para os ingleses importassem em cerca de 350 milhões de libras por semana. Tal como eram mentira a maior parte das imputações feitas a Hillary Clinton, imputações que iam de pedofilia a corrupção.
As mentiras do “Brexit” e da eleição presidencial americana tiveram consequências que todos iremos pagar, muitas delas irreversíveis e todas danosas. A segurança e a prosperidade da Europa estão ameaçadas e a luta contra as alterações climáticas está comprometida, esta pela saída dos EUA dos acordos de Paris.
É curioso que a resposta de Trump quando lhe são desmascaradas as mentiras, quando o “New York Times” ou a CNN o apanham em mais um escândalo ou mentira, seja de classificar logo essas notícias como “fake news”. Com ponto de exclamação e ar de desdém. Curioso também é como isto funciona junto do seu eleitorado mais fiel. Quando alguma notícia desagradável surge, basta-lhe atirar para o ar, com ar convincente, o refrão do costume, “fake news!”, e pronto, problema resolvido. Se alguém resolver verificar os factos de alguma afirmação e descobrir a mentira, lá vem outra vez o refrão, muito mais eficaz do que do que a laboriosa, às vezes cansativa, desmontagem dessa mentira – e quem procura a verdade acaba por ficar com a fama de ser o mentiroso.
Está a crescer e a ganhar cada vez mais adeptos esta prática, de plantar mentiras ou de negar a verdade, recusando ao mesmo tempo o trabalho de fazer a verificação dos factos. Estes não interessam já, o que interessa é a perceção que se quer criar sobre os factos: a inauguração de Obama foi muito maior que a de Trump? Não interessa, o que interessa é que a de Trump, naquele momento, parecia maior – o que é o mesmo, dizem eles, que ser maior.
Às vezes vai-se longe demais. Depois do massacre de Sandy Hook, em que foram assassinadas a tiro dezenas de crianças numa escola primária, apareceram adeptos das teorias da conspiração a dizer que o massacre tinha sido perpetrado a mando do governo dos EUA para justificar leis mais rigorosas no controlo da posse de armas, ou que esse massacre era uma invenção dos media e nunca tinha acontecido. Alex Jones, o autor desta última teoria, acabou por ser levado a tribunal por um grupo de pais das crianças mortas no massacre, com queixas de difamação e pedidos de indemnização pelos danos causados pela difusão dessa teoria. Alex Jones, já recentemente, veio a arrepender-se das mentiras que difundiu e diz agora que estava enganado. É que a justiça não costuma ser permeável às “fake news” e tem como objetivo precisamente a busca conscienciosa da verdade. É claro que o arrependimento de Alex Jones, à boca da sala de audiências, é hipócrita e serviu apenas para se tentar salvar de uma condenação.
A pergunta agora é a do título desta crónica: há que proibir as “fake news”? A resposta só pode ser um enfático não. Os mentirosos têm de ser punidos, mas apenas quando as suas mentiras implicarem a prática de um crime ou causarem um dano, quando violarem alguma lei. Mas mais importante que isso é sermos todos capazes de manter um espírito aberto e crítico e aprendermos a verificar as notícias que nos vão servindo, procurando mais do que uma fonte e tirando um momento para desmascarar os muitos mentirosos que infestam a internet. Já agora: o défice aumentou brutalmente nos EUA, mas com Trump, quando baixou os impostos aos ricos e prejudicou gravemente o seu fiel e ignorante eleitorado.