Há uma luz, há um dedo, há uma inquietação. Pode haver uma sonorização do jogo, essa coisa infame, quando repetida a cada minuto, regressa de novo e volta e persiste e inferniza o sossego dos outros. Há um ecrã, um objeto de palma da mão e uma cabeça baixa e um ostensivo desprezo por tudo à roda. Não se fala, não se conversa, nada mais interessa, há uma bolha envolvendo cada micro espaço onde nidifica uma existência anémica do ponto de vista social, um mundo que é nada, porque não relacionado. A existência faz-se entre, construindo âncoras e projetando futuros mas aqui nunca. Sou eu no micro espaço onde jogo uma ficção que criaram para mim. Sou uma peça de um cenário de uma história inexistente onde construo a maior das falácias: um futuro que o não é porque termina com o jogo. Podes jogar de novo. Cada momento é outro constructo que se aniquila em si mesmo e portanto gasta a nossa vida sem empenhamentos nem objetivos além da obsessão de repetir e voltar a fazer. O jogo é outra cultura. As redes sociais agarram do mesmo modo, mas só funcionam na interação. Se ninguém nos visualiza ou interage perde o fascínio. A presença do outro constrói essa realidade virtual onde estamos acompanhados e surpresos do interlocutor. O insulto é mais fácil que na vida, que a quatro olhos, mas existe como inevitabilidade da distância entre parceiros de uma emoção e de uma exposição onde ninguém se admite tolerar opiniões. Estás na minha página a dizer coisas que não quero. Bloqueiam, apagam. No jogo, desligar é muito mais difícil porque implica desfazer a relação com a emoção do gesto praticado. Discutem com a mãe a hora do almoço. Não vou. O pai apaga a luz!
Por: Diogo Cabrita