Passado o interregno da governação (com o mais pequeno governo da democracia portuguesa), o novo primeiro-ministro, António Costa, vai governar um “tempo novo” marcado pelo “virar de página”. António Costa, após tomar posse, apresentou-se ao país como o mensageiro do “tempo novo”, um tempo que deverá ser a antítese do tempo anterior, um tempo que foi marcado por «uma grave degradação dos valores e dos laços que unem a comunidade». Seja! Ou pelo menos essa é a grande esperança da maioria dos portugueses depois de quatro anos de austeridade.
Muito para além das fórmulas de cálculo (político) existentes, como muito bem interpretou Manuel Carvalho (Público, domingo), António Costa esvaziou os preceitos habituais da política portuguesa e surpreendeu todos pela forma como forçou a esquerda a procurar um lugar perto de si para não perder a libertação do país do alegado radicalismo ideológico de Passos e companhia. Muito mais do que afinidades, Costa preencheu o campo dos interesses; não é uma casa comum da esquerda que cresceu, foi o interesse comum das esquerdas que se sobrepôs às diferenças e às divergências. Depois do PSD ter andado para a direita, o PS agregou o descontentamento e semeou uma nova esperança – falta perceber até que ponto o “tempo novo” consegue sobreviver aos “ismos”, às divergências ideológicas, aos mercados e à espiral despesista que se anuncia.
Entretanto, aplaude-se o fim dos exames do 4º ano e anseia-se pela reposição salarial. O projeto de resolução do PCP para acabar com as portagens entre Torres Novas e a Guarda é o ponto de partida para a exigência do cumprimento das promessas de António Costa – que afirmou ser necessário facilitar o acesso ao interior. Como aqui se escreveu na semana passada, espera-se que o novo governo olhe para o país como um todo e que promova a coesão territorial (lamentavelmente este governo acabou com a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, mas isso pode ser circunstancial). E não é apenas a reversão das portagens nas antigas scuts que deve ser exigida ao governo ou o relançamento da Fase II do Hospital da Guarda, que o governo anterior enterrou, é também a reabertura dos tribunais de comarca que foram encerrados, os serviços de saúde de proximidade, inclusive de urgências, que desapareceram por puro economicismo, os serviços descentrados que foram concentrados, o reordenamento da orgânica do turismo, com o regresso de uma região de turismo centrada na Serra da Estrela, ou a própria regionalização, como forma de descentralizar funcionalismo e planeamento do país. Muitos esperam muito do novo governo, mas poucos acreditam nas mudanças anunciadas; muitos desejam o fim da austeridade e das políticas recessivas, mas poucos vêm uma luz ao fundo do túnel. Portugal tem de recuperar o ânimo, o otimismo e a fé e deixar para trás o tempo dos sacrifícios e empobrecimento, mesmo sabendo que 40% da despesa vai para pensões e 30% para salários… é possível mudar o rumo do país. É esse o desejo que temos; é esse o repto a António Costa; é essa a utopia que desejamos para Portugal e para os portugueses. É possível mudar. Vamos conseguir.
Luis Baptista-Martins