1. Os ataques terroristas da passada sexta-feira em Paris foram um ataque ao coração de França, mas também à Europa, ao Ocidente e à liberdade. O sangue que os terroristas derramaram por Paris provocou na sociedade, alicerçada em valores humanistas, sentimentos de tristeza, impotência e repulsa. Raiva, mesmo. Mas essencialmente emoção. Depois, também de solidariedade, comprovando uma vez mais que a dimensão civilizacional ocidental, e desde logo da França, está muito para além do sentir radical, religioso, vingativo e retrógrado que outros professam. O golpe perpetrado em Paris foi um golpe contra um estilo de vida, contra a cultura e contra pessoas inocentes – foi um golpe feito por cobardes velhacos que devem ser perseguidos.
Mas a tragédia de Paris tem uma plêiade de consequências, muito para além da reação bélica do presidente francês. O medo instalou-se em Paris, que por estes dias é uma cidade militarizada; a desconfiança generalizou-se e a sensação de insegurança causa o pânico perante qualquer movimento estranho; a situação de guerra efetiva na Síria multiplicou-se; regressarão as fronteiras na Europa… e, por último, os que fogem, precisamente do terrorismo no médio-oriente, serão as maiores vítimas do terrorismo na Europa: os refugiados.
Numa «reação primária», como muito bem se comentou no Editorial do PÚBLICO (terça-feira), depois de a polícia francesa ter anunciado que encontrou junto a um dos terroristas suicidas um passaporte sírio de um migrante que entrara através da Grécia pela «rota dos refugiados», muitos apressaram-se a fazer ligações, inaceitáveis e precipitadas, entre terroristas e refugiados. De facto, a generalidade dos migrantes que fogem da Síria ou da Eritreia ou do Afeganistão fogem por medo ao terrorismo e à morte. Como se viu pela autoria dos atentados, um terrorista pode chegar à Europa pela rota dos refugiados, ou nem sequer ter saído da Europa tendo sempre vivido num bairro como o de Molenbeek, às portas de Bruxelas.
2. Há 20 anos, no final do mandato do então primeiro-ministro Cavaco Silva, foi lançado o primeiro programa que apostava na metamorfose do turismo do Interior: a criação do programa Aldeias Históricas de Portugal. Então, catalogaram-se aquelas aldeias cuja marca distintiva, a sua representatividade, a sua arquitetura e património representavam um pouco da ideia de urbe medieval, espaço identitário nacional e território do imaginário da história e da nacionalidade. A Monsanto, que a ditadura já catalogara como a «mais portuguesa de Portugal», juntaram-se nove aldeias (a saber: Castelo Rodrigo, Almeida, Castelo Mendo, Marialva, Linhares, Sortelha, Castelo Novo e Piódão), definiram-se as premissas e promoveu-se uma dinâmica de intervenção, como até então não se vira em Portugal. Depois, entraram, com toda a justiça, Belmonte e Trancoso. O único erro programático foi a inclusão de Piódão que impediu o desenvolvimento de uma rede integrada de proximidade – não que Piódão não mereça, mas pela distância podia ter integrado porventura com mais benefícios outro tipo de programa. Com a requalificação do espaço público, as Cartas de Lazer e as atividades lúdicas promovidas, o programa foi um sucesso em termos de abertura a novos visitantes e novas aspirações turísticas. Mas a falta de iniciativa privada, por falta de apoio e capacidade de investir ou pela simples sensação que o investimento público iria fazer tudo, levou a que, passados 20 anos, as Aldeias Históricas tenham passado de moda e perdessem a sua auréola e glamour. Se olharmos para trás facilmente se percebe que não houve investimento sustentado, gastaram-se milhões sem resultados e que os planos estratégicos que continuam a ser definidos são uma treta que copia as tretas anteriores, para disfarçar a falta de ideias e capacidade para imprimir dinâmicas alternativas. Não basta ter um bom coordenador (a), seria necessário ter parceiros e dirigentes audazes e capazes de mudar alguma coisa.
Luis Baptista-Martins