Na minha última crónica iniciei o tema da Lusitânia romana, objeto de uma exposição que será apresentada em breve no Museu Nacional de Arqueologia. Nesse texto abordei a criação da Província e o seu processo de romanização. Consideremos agora a fundação da sua capital: Augusta Emerita.
Devemos recorrer às Res Gestae de Augusto, narração onde o primeiro imperador nos dá conta das suas principais obras, e ao historiador Díon Cássio para concluirmos que terminada (aparentemente) a guerra na Península contra os Cântabros e os Ástures (25 a.C.), Augusto mandou licenciar parte das tropas e criar a colónia Augusta Emerita com os seus veteranos. Ao contrário do que era costume na época republicana, Emerita foi erigida num local afastado dos confrontos bélicos do momento, estrategicamente junto ao rio Guadiana, perto de locais onde outros generais romanos tinham assentado os seus acampamentos militares décadas antes e de importantes recursos mineiros. Por outro lado, o território não era muito povoado por indígenas e podia fazer comunicar diversos pontos importantes da Península.
Sabemos que a criação de uma colónia romana era um processo complexo e demorado. Era necessário definir, organizar e repartir as terras pelos primeiros colonos, fases imbuídas de diversos rituais fundacionais e procedimentos administrativo-jurídicos. No caso de Emerita, o primeiro censo contava com cerca de 3000-4000 homens, veteranos das legiões V Alaudae e X Gemina e, nos seus primórdios, o governador da província Ulterior, Públio Carísio foi o responsável pela organização territorial e o supervisor do novo assentamento urbano, certamente acompanhado de perto por Augusto. Mas o esplendor da nova colónia chegaria com o tempo e com a estadia de Agripa, genro do imperador Augusto, na cidade, tornando-se possivelmente seu patrono e a quem se pensa dever as expensas do sumptuoso teatro inaugurado em 16-15 a.C.. Assim, se numa primeira fase os contingentes militares estabelecidos foram responsáveis pelo programa de obras públicas indispensáveis (malha viária reticular, ponte sobre o Guadiana, fórum primitivo, o aqua Augusta…), a monumentalização, o embelezamento e a marmorização do centro urbano chegariam mais tarde pela mão de figuras políticas influentes e de privados – devotos da família imperial e beneficiando da sua munificência –, que se empenharam em fazer de Emerita Augusta uma capital à imagem de Roma, mesmo numa longínqua província considerada bárbara e hórrida como a Lusitânia. Exemplo claro disso é o conjunto de culto imperial do Fórum Provincial de Mérida, encarregado pelo governador Lucius Fulcinius Trio seguindo o modelo do Templo da Concórdia de Roma.
Tânia Saraiva
Historiadora da arte