O cartoonista José Vilhena, de 88 anos, fundador das revistas satíricas “O Moralista” e “Gaiola Aberta”, morreu no sábado em Lisboa, vítima de doença prolongada.
Natural de Figueira de Castelo Rodrigo, o humorista estudou Arquitetura na Escola Superior de Belas-Artes, no Porto, vindo para Lisboa na década de 1950 tendo colaborado como cartoonista com os jornais “Diário de Lisboa”, “Cara Alegre” e “O Mundo Ri” – de que foi um dos fundadores. Foi um dos mais cáusticos e irreverentes desenhadores portugueses, com uma obra «na tradição de Gil Vicente, Bocage ou Bordalo Pinheiro», sublinhou o sobrinho Luís Vilhena num comunicado enviado à agência Lusa, considerando o seu trabalho «uma crónica dos tempos. Umas vezes pela crítica de costumes, outras vezes no olhar sobre a política, outras sobre a Igreja e quase sempre sobre a mulher». José Vilhena cessou a sua atividade em 2006. O INTERIOR falou com o cartoonista em fevereiro de 2000 a propósito de dois quadros que pintou, ainda jovem, nas Freixedas (Pinhel), onde passou parte da infância e juventude.
São obras mais recatadas e que contrastam singularmente com a sátira, o humor corrosivo e o traço provocador pelo qual o cartoonista ficou conhecido entre uma geração de portugueses no antes e no pós-25 de abril. Um dos quadros, intitulado “A Assunção de Nossa Senhora”, pertence à paróquia de Pinhel, tendo sido pintado na década de 40 do século passado por encomenda do padre da altura. No ano 2000 O INTERIOR descobriu-o enclausurado na estrutura do altar-mor da igreja matriz da “cidade-falcão”. Terá sido descido do portal do altar depois de um concílio do Vaticano ter decidido, em 1963, alterar radicalmente a estrutura da cerimónia religiosa. A O INTERIOR, José Vilhena considerou aquele trabalho «uma brincadeira» da sua juventude: «A mocidade é muito atrevida. Eu fiz uma coisa daquelas sem grandes bases e felizmente que está lá para trás», disse, tendo-se mostrado surpreendido com a possibilidade da tela ter sobrevivido ao tempo. Irónico, o pintor acrescentou que naquela altura «era capaz» de fazer tudo. «Se me tivessem pedido para pintar o teto da capela Sistina não teria hesitado», garantiu, no meio de uma gargalhada. Já nas Freixedas, em 1948, pintou na madeira do antigo salão paroquial uma tela que representa a figura teatral da tragédia.
Luis Martins