Numa excelente reportagem publicada pelo jornal “Público” sobre repovoar o interior, em França, com o título “Um mundo rural moderno está a desenvolver-se em Auvergne”, como muito bem descreveu a jornalista (Ana Cristina Pereira) aquela região, no maciço central francês, fez do repovoamento uma prioridade depois de décadas de êxodo rural e de nos últimos trinta anos ter perdido milhares de habitantes. Em 2004, e perante o abandono do mundo rural e com uma baixa taxa de natalidade, criou-se o conselho regional de Auvergne e lançaram-se as sementes para atrair novos residentes. O diagnóstico estava feito, o esvaziamento das aldeias tinha de ser contrariado, o envelhecimento abrupto estava a ditar o desaparecimento rural que era urgente estancar – tal como acontece no interior de Portugal. Promoveram uma agência regional de desenvolvimento que estudou o problema e definiu pacotes de medidas para relançar o desenvolvimento regional e atrair pessoas e empresas, estruturar ofertas, formar e monitorizar agentes territoriais. O projeto envolveu toda a região, porque a escala é determinante para o sucesso das medidas, adotaram-se novas tecnologias e delineou-se um plano servindo-se da Internet e do marketing digital. Procuraram uma marca âncora assente na história e nos produtos endógenos e investiram nela como produto diferenciador e único. Valeram-se da natureza e investiram na cobertura de banda larga para promoverem a região como um lugar onde a vida rural e a vida moderna se combinam com harmonia entre vida profissional e a familiar, o desfrutar do meio ambiente e o lazer. O ecoturismo passou a ser um desígnio da região e as muitas ideias têm ditado um manancial de pequenas soluções que impuseram a completa inversão da tendência de fuga: a partir de 2007, a Auvergne acolhe 17 mil novos residentes por ano (muitos emigrantes portugueses) e o repovoamento será a prioridade por mais uns anos. Muito para além da mensagem provocatória de que em Paris se vive mal ou de que nas grandes cidades não há segurança, que fez parte das muitas campanhas que lançaram ao logo destes anos, a equipa desenvolveu campanhas de valorização muito assentes na tal ideia de ruralidade moderna, e inventou recentemente mais dois programas para chamar gente e impulsionar dinâmicas inovadoras: o “new deal digital”, com seis meses de salário, seis meses de casa, seis meses de escritório, e o “new deal biotecnologia”, com um ano de salário, um ano de casa, um ano de laboratório.
Com ideias e apoios comunitários foi possível transformar uma região deprimida e de baixa densidade, numa região dinâmica, moderna e com crescimento populacional. Lá, como cá, o campo foi abandonado, mas houve visão de alguns que se uniram em prol do interesse comum. Inventaram um novo conceito de mundo rural moderno, que o interior português também pode desenvolver. A marca Serra da Estrela é excelente e faz todo o sentido servir de âncora e ponto de partida para lançar o repovoamento da região.
O programa “Novos Povoadores” (dinamizado pelo nosso amigo e colaborador Federico Lucas) tem procurado sensibilizar municípios, entidades e pessoas para esta causa, quase sozinho e nem sempre devidamente ouvido, mas a génese da solução pode passar pelas medidas que o projeto preconiza. Trazer pessoas do litoral para o interior é tarefa hercúlea, mas que é urgente empreender. Os concelhos da Beira e Serra da Estrela estão a perder milhares de residentes todos os anos e não é com o jargão político e os programas eleitorais que se vai inverter a tendência. É necessário um rol de novas ideias e processos inovadores que mudem a forma de atrair pessoas. O futuro da região passa por planificar, por recorrer às novas tecnologias, por investir na banda larga, por estruturar campanhas proactivas, por recorrer ao marketing e ao marketing digital (porque o mundo está todo à distância de um clique), por assegurar um mundo rural moderno, por garantir segurança e conforto, por apostar na educação e na saúde, por qualificar pessoas que possam receber e ajudar novos povoadores… Como em Auvergne, nós também temos de conseguir. Nós também podemos conseguir.
Luis Baptista-Martins