Entre o ser e o parecer reside um abismo. Que o diga a mulher de César. E o PS, já agora. Abismo que simboliza desconhecido. E, já se sabe, o desconhecido gera desconfiança e temor. O mais recente estudo de opinião da Eurosondagem mostra que um cenário de maioria é cada vez mais improvável e confirma a tendência de aproximação entre o PS e os partidos da maioria, enquanto o da Universidade Católica coloca a coligação, pela primeira vez, à frente dos socialistas.
Descontando o elevado número de indecisos, especialmente na sondagem da Católica, e os efeitos do caso jurídico-político em torno de José Sócrates, os eleitores parecem sinalizar negativamente o comportamento errático socialista.
Enquanto o PSD e o CDS, não obstante vários erros dificilmente revogáveis, apostam tudo na valorização de indicadores, hoje com tendência positiva, desde o emprego ao investimento, passando pelas exportações, o PS vive aprisionado entre o que já defendeu e gostaria de não ter defendido e aquilo que desejava prometer mas, por inércia ou falta de coragem, não promete.
A crise grega é ilustrativa. Depois do regozijo pela vitória do Syriza, o PS faz de tudo para se afastar da coligação de esquerda radical que, veja-se a irresponsabilidade, sustenta um perdão de dívida como premissa fundamental para tornar viável uma dívida pública que anda já na casa dos 170% do PIB. Renegociação de dívida que António Costa sustentou ser fundamental discutir no âmbito das instituições europeias, mas que, entretanto, parece ter ficado pelo caminho. Decisão que não será alheia à incerteza em relação ao futuro da Grécia e ao reforço do discurso europeu de que não há alternativa à consolidação orçamental consubstanciada em virtuosas políticas de austeridade.
Em paralelo, PSD, CDS e o Presidente da República fazem figas para que a Grécia saia do euro. Realidade que permitiria recorrer aos propalados “cofres cheios” que a ministra Maria Luís Albuquerque reconheceu serem dívida. Porém, dívida contraída a juros significativamente inferiores àqueles que serão imediatamente exigidos nos mercados secundários depois de um “Grexit”. “Cofres cheios” que permitem aguentar apenas uns meses, todavia meses que vão para além das eleições de Outubro. A estratégia é simples: vejam como acabou a Grécia com as conversas de fim de austeridade e como nós estamos estáveis – há cofres para rentabilizar eleitoralmente. As pessoas gostam e querem segurança e quando os efeitos sistémicos de um eventual “Grexit” chegarem, já as eleições terão passado.
Se a coligação aposta todas as fichas na “previsibilidade”, o PS joga tudo na imprevisibilidade. Depois de anos a criticar o sentido único das políticas do Governo e a ideia das inevitabilidades, o PS sustenta, agora, a outrora criticada baixa da TSU como única alternativa para estimular o crescimento económico. Descida transitória para trabalhadores e empresas, a ser suportada por uma estrutural “diversificação de fontes de financiamento”. Como escreveu Bagão Félix no Público, trata-se de uma inovadora “medida estrutural (sabiamente) conjuntural”.
Depois das eleições europeias de há um ano, António Costa avançou para a liderança socialista porque em 2015 não bastaria uma “vitória por poucochinho”. Agora o importante é só vencer as eleições, se possível com a já distante maioria. As constantes mudanças de rumo mostram um PS que segue diletantemente em busca de um proveito eleitoralista que afinal, feitas as contas, o não parece ser.
Por: David Santiago