Jargão de obituário: Morreu o ladrão. Lápide de defunto: jaz uma besta-quadrada. Mármore numa entrada: aqui viveu um canalha. Toponímia: Rua do Bancário Vigarista. Assim, de modo cruel, o povo de “A ver os Navios” decidiu homenagear todos os que detestava. Durante quatro décadas de democracia elevou a nome de Rua, a nome de Escola, a Presidente de Instituição, muitos dos seus que se foram destacando. Ao longo dos meses de 2014, o ano podre, a deceção foi-se instalado. Primeiro partiram as lápides da toponímia. Depois queimaram os documentos assinados por presidiários. No final da purga não tinham água, não tinham luz, não havia como saber os nomes das ruas e descobrir as campas dos parentes. Lembrou-se então o espampanante Eleutério (gay, juiz e toda a vida honesto) de juntar os simples, os discretos e os exóticos, todos quantos pagassem impostos liberais. Todos os que estavam de bem com o Registo Criminal. A reunião cursou com o acinte, depois com o mal dizer, depois veio a azia, mas no final tinham decidido virar o destino. O incompetente do diretor voltava a ter memória, mas com o epiteto do seu fracasso. Incompetente Rodrigues. Ladrão Morgado. Borra-botas Ferreira. Canalha Luísa. Vigarista Cáceres. E assim por diante. As ruas tinham nome. O cemitério voltava a ter flores. A verdade é que todos eles, dos pedófilos aos bandidos, dos canalhas aos violadores, todos recebiam exéquias e tinham flores. Em “A Ver os Navios” nasceu a expressão para cada panela há seu tampo, para cada cão vem uma cadela!
Por: Diogo Cabrita