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Filhos de um Deus menor

Crónica Política

Deu recentemente à estampa um estudo encomendado pelo Ministério da Educação acerca da avaliação das políticas públicas na inclusão de alunos com necessidades educativas especiais. Descontando o facto da avaliação do trabalho realizado pela tutela não ter sido realizada por uma entidade independente, o que garantiria uma melhor compreensão acerca daquilo que realmente anda a ser feito e da forma como são gastos os dinheiros públicos, importa ainda assim que nos debrucemos sobre algumas das conclusões do referido estudo.

O número de alunos com necessidades educativas especiais duplicou nos últimos dois anos. Não há dinheiro, material técnico de apoio ou meios humanos suficientes para apoiar todos os alunos. Os planos de ação demoram demasiado a aprovar e a implementar. Por tudo isto mais de metade dos alunos fica de fora. E estamos a falar de crianças com cegueira, surdez, autismo ou multideficiência, a quem gostaríamos de integrar e de garantir o êxito educativo.

Desde a ausência generalizada de planos de estudo individualizados e adaptados às necessidades específicas de cada caso, passando pelo deficiente apoio às escolas e famílias ou pelo reduzido número de intérpretes de Língua Gestual Portuguesa, chegando-se finalmente à ausência de supervisão na transição para a vida pós-escolar, o estudo aponta para a existência de um mar de dificuldades por solucionar.

O problema é que a não inclusão destes alunos na sociedade, nos seus serviços, nas suas instituições, enfim, nos grupos e estruturas que interessam ao desenvolvimento de todos, representa um rude golpe na participação e na cidadania destas pessoas. Assim se promove por omissão, ou quiçá por intenção, a existência de preconceitos e de barreiras. Predomina a defesa dos valores das instituições à custa dos valores das pessoas. Aliás, foi este mesmo governo que determinou, por portaria, a regulamentação da presença (ou a exclusão) de um grupo significativo de alunos com necessidades educativas especiais nas escolas secundárias.

A ativista política Helen Keller, cega e surda, o célebre matemático John Nash, esquizofrénico, ou o famoso físico teórico Stephen Hawking, vítima de doença neuro degenerativa, são apenas alguns dos exemplos que comprovam como a sociedade humana não pode dispensar o que estas pessoas têm para dar. Imagine-se o que ganharíamos se muitos outros pudessem começar bem mais cedo a trilhar o caminho do sucesso.

Uma sociedade evoluída não se distingue pela sua riqueza material, pela extensão do seu território ou pelo número dos seus habitantes. Nem pela dimensão do seu exército, valor do PIB ou situação das contas públicas. Uma sociedade evoluída distingue-se pela sua capacidade para garantir a inclusão de pessoas com deficiência nas estruturas que fazem funcionar o coletivo. Caso contrário, aos inadaptados restam os ghettos. Ou pior.

Por: Jorge Noutel

* Militante do Bloco de Esquerda

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