A “Operação Labirinto” mostra-nos o país tal como ele é, um país onde a corrupção está entranhada nas mais diversas instituições do Estado português, mesmo ao seu mais alto nível.
Podíamos centrar o debate apenas nas responsabilidades criminais ou políticas, mas, infelizmente, as negociatas à volta dos “vistos gold” exibem o espirito oportunista e aproveitador de quem tem acesso a alguma forma de poder. Aliás, pior, este é um dos casos de corrupção mais graves nos últimos anos em Portugal e onde ela nunca poderia suceder, nas mais altas instituições do estado, em organismos sensíveis, que deveriam ser de controlo, acima de qualquer suspeita, inatacáveis e onde, isso sim, deveria haver as mais absolutas garantias e convicções de idoneidade, honorabilidade e honestidade.
O indício de envolvimento de diretores de serviços policiais e a participação ativa de dirigentes de topo de organismos sensíveis como o SEF e o SIS, instituições que fazem parte dos pilares básicos da sociedade, põem em causa a própria autoridade do Estado.
Por tudo isto, o ministro Miguel Macedo demitiu-se. Obviamente! Não porque esteja diretamente envolvido, mas porque o estavam, e sobremaneira, pessoas da sua confiança pessoal, profissional e inclusive societária. Ou seja, como tantas vezes sucedeu com outros governantes (demasiadas vezes), à sua volta havia um grupo de meia dúzia de oportunistas que utilizando a “coisa pública” de acordo com os seus interesses, enchia os bolsos enquanto abria as portas de Portugal e da Europa a qualquer investidor com meio milhão de euros e mais algum para pagar luvas e comissões. Se noutras dimensões este comportamento é inadequado a este nível é inaceitável.
Estranhamente, o primeiro-ministro terá desvalorizado as responsabilidades políticas do seu ministro e, nesse sentido, terá pretendido que este não abdicasse e continuasse no Governo como se não houvesse responsabilidades políticas a assumir. De resto, não é a primeira vez que Passos Coelho assobia para o lado presumindo uma inimputabilidade para o próprio e para os que o acompanham. Por isso, como muito bem interpretou Manuel Carvalho (Público, terça-feira), Miguel Macedo tem responsabilidades políticas pelo que aconteceu, percebeu-o e renunciou, mas, «infelizmente, o primeiro-ministro deve julgar que o nojo que um país em crise sente com este festival de escândalos é apenas um espirro e tentou conservá-lo». Passos Coelho não percebeu que «a dimensão do escândalo é tão aterrador» que a facilidade com que o encarou é vergonhosa e provocou «indignação» e o desacreditar nas instituições. O Governo não saiu reforçado com a demissão de Macedo; Passos Coelho ficou refém de si próprio, do seu autismo e da sua incapacidade para saber distinguir o essencial do acessório.
Infelizmente, a mentalidade de Passos tem adeptos por todo o lado. São muitas as instituições e os dirigentes que não percebem ou não têm a idoneidade para saber separar o “trigo do joio” e misturam os interesses privados com os públicos, gerem as suas carreiras de acordo com interesses pessoais, aproveitam cargos públicos para fazer negócios e negociatas, consideram-se acima de qualquer suspeita, ameaçam todos os que os confrontam, perseguem quem revela alguma das suas “habilidades”, pervertem todas as regras. O país está cheio de oportunistas…
Luis Baptista-Martins
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