Isto não é abandono é queda, é um tombo e uma perna quebrada. Isto não é falência, é descasque, é fruta não protegida. Isto não é morte, é vala comum. Deixo-te ao sol para que te vás demolindo e desconstruindo. Por tudo isto abandono é arte, é glamoroso, é requintado. Aqui o traste fica composto e bem mostrado. Exibe-se o fim! Por tudo isto vão falindo bancos, vão-se entregando casas, vão-se secando as piscinas, abandonando os cães e os cavalos. São tetos que tombam, são vidros que partem, são indústrias que fecham, são negócios que acabam. Abandono é solução quando o modelo termina. Partir é uma solução para pratos demais na cozinha. Abandonar não é destruir, é ir partindo, deixar vergar, deixar torcer, deixar enrugar, até que tombe. Depois da nobreza ficaram os palácios morrentes, as ruínas tornaram-se típicas e agora chegam os turismos de habitação. Depois do Serviço Nacional de Saúde ficarão hospitais mortos e por fim ruínas e depois talvez museus ou centros de habitação para pobres. O abandono nasce da morte de um modelo, da chegada de um vírus contagioso. O mundo que se desenvolvia com o dinheiro dos outros agora só avança com aquele que te sair do bolso. É um processo de regressão e um caminho que leva à desconstrução da natureza dos bancos e ao valor dos salários. A mudança está a depenar a sociedade onde nasci e quando terminar come-se carne seca, a cabidela é impossível pois a sangria veio antes da morte. Não sei se bem se mal, sei que assisto impotente a um fim e por mais que o tente perceber sou arrastado para a necessidade de participar, de fazer parte do processo. Sei que tombo como os outros, sei que estremeço, sei que me secam até curtir a pele, mas vou, mas voto, mas participo. Não abandono e não desisto, mas posso ter que emigrar como tantos.
Por: Diogo Cabrita