É um mistério a razão de alguns países não conseguirem assegurar um nível de vida decente à generalidade dos seus cidadãos. Muitas vezes esses países têm amplos recursos naturais, uma população jovem, uma situação geográfica privilegiada e, mesmo assim, encontram-se no fundo da tabela em todos os índices de desenvolvimento humano. Há depois países como a Suíça, sem recursos naturais, sem condições sequer para a agricultura, que prosperam.
Escreveu-se já muito sobre isso e surgiram muitas teorias. Há alguns anos David Landes fez estragos com a publicação de “A Riqueza e a Pobreza das Nações” (Gradiva, 2001), onde demonstrava a superioridade das nações anglo-saxónicas e protestantes sobre as demais, em consequência dos valores que defendiam, mais propícios ao desenvolvimento dos negócios, à inovação e à criação de riqueza. Nesse livro os países católicos e muçulmanos saíam maltratados: os primeiros porque a ética católica, que promete um perdão geral após uma vida de dissolução mediante um simples acto de contrição, tornava eticamente inútil uma vida de trabalho; no segundo caso porque a estrutura da sociedade, marginalizando as mulheres, e o desprezo pelo conhecimento não propiciavam um bom ambiente para o crescimento económico.
Daron Acemoglu e James A. Robinson, professores, respectivamente, do MIT e de Harvard, vão mais longe em “Porque Falham as Nações” (“As Origens do Poder, da Prosperidade e da Pobreza”) – Círculo de Leitores, 2013. Distinguem as nações, mas também as políticas e os sistemas económicos em duas grandes categorias: inclusivas (as que dão oportunidades a todos) e extractivas (aquelas em que uma oligarquia, ou uma classe, ou um partido se apoderam do aparelho de estado ou dos recursos naturais de um país para benefício de uma minoria à custa do empobrecimento dos restantes.
Como primeiro e expressivo exemplo dão o das cidades gémeas de Sonora, uma no México e a outra nos Estados Unidos. Estão separadas apenas pela fronteira, mas partilham raízes culturais, religiosas, étnicas, e o nome. Em tudo o mais são profundamente diferentes: a mortalidade infantil, a criminalidade, a baixa esperança de vida, a baixa escolaridade, a corrupção, o nível de vida são muito piores na Sonora mexicana – e por isso se tenta aí emigrar para Norte. Não há uma razão aparente para isso, pelo menos de acordo com a grelha de análise de David Landes, mas se recuarmos no tempo e recordarmos o modo de construção das nações latino-americanas iremos encontrar padrões comuns: em quase todas elas verificou-se a depredação dos recursos naturais existentes e a escravização dos nativos em benefício de uma pequena minoria. A instituições foram criadas e desenvolveram-se tendo em mente a protecção dos interesses dessa minoria, em prejuízo dos interesses da nação como um todo.
E Portugal? Teremos de admitir que o interesse comum não parece ser o objectivo de quem está no poder. O objectivo parece ser antes a defesa dos interesses de dois poderosos lóbis: da banca e do betão. É daí que saem e é para aí que se deslocam, após funções governativas, os aparatchiks do sistema, sempre os mesmos e sempre à volta dos mesmos três partidos. Entre eles, e com os seus, foram engordando o tamanho, o custo e a influência do Estado. A rotatividade no poder teve como efeito a chegada de sucessivas e dispendiosas levas de Boys, que foram ficando e engrossando a despesa do Estado. Esta imensa mole de gente, o conjunto das empresas e dos bancos que lidam mais directamente com o Estado, negoceiam com ele e trocam com ele recursos humanos, extraem neste momento o melhor dos recursos da nação e é para proteger os interesses desta colossal máquina, para a poder manter em movimento, que estamos a ser sugados até à exaustão. Não sei como se resolve isto, mas já se fizeram revoluções por menos.
Por: António Ferreira