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A Guarda aos 813 anos

Opinião

A propósito do 813º aniversário da Guarda, ocorre-me citar José Gil que, no seu livro “Portugal, Hoje: O Medo de Existir”, conta uma anedota que exprimia a rivalidade entre duas aldeias vizinhas da Beira Baixa: «Tive uma ideia para ir à Lua. Basta que um de nós suba para os ombros do primeiro, que um terceiro suba para os ombros do segundo, e assim de segundo fazer a escada mais alta possível em direcção à Lua. E quando já não houver mais gente, faz-se subir o primeiro que está no chão até ao topo, depois o segundo que ficou com os pés no chão sobe também, e assim sempre, sem parar, até chegar à Lua. Não faltarão nunca homens».

Nada encontrei de mais significativo para ilustrar o modelo de desenvolvimento escolhido para a Guarda ao longo de mais de três décadas.

Por isso, o empobrecimento das pessoas e, consequentemente, das instituições é o traço mais marcante da Guarda dos nossos dias, cujo passado glorioso foi interrompido em nome de um rumo errado e errante, não de soluções mas de dissoluções, que foram destruindo o seu tecido económico e social.

Esta visão, que pode parecer pessimista, apenas tem como defeito um incontornável realismo, num contexto socioeconómico de uma Guarda que já nada guarda e de uma fortaleza que enfraqueceu.

Nesta recente caminhada para o declínio, muitos pecaram por ação e outros, tão responsáveis como os primeiros, pecaram por omissão.

A tremenda erosão que o concelho da Guarda tem vindo a sofrer nos últimos anos no seu tecido empresarial, com graves consequências ao nível do emprego, lançou milhares de pessoas na incerteza, levando-as a ver na emigração a única oportunidade de sobrevivência. E isto não é um efeito direto da recente exiguidade do país, mas sim de um longo período de crise, pelo qual a Guarda tem passado, na sua História mais recente.

Ao longo da última década, a nossa cidade transformou-se numa região de exclusão. Basta referir que, entre 2001 e 2011, o concelho perdeu 3% da sua população. Daí para cá, terá perdido, certamente, uma percentagem ainda maior.

Esta é apenas a consequência natural de mais de 36 anos de um poder autárquico que foi suportado pela ausência de planeamento, de visão estratégica de desenvolvimento e por um rumo enviesado na definição de prioridades, que apenas nos aportou uma ENORME DÍVIDA, que não tem tradução na qualidade de vida das pessoas.

Percebe-se hoje, mais do que nunca, que o futuro da Guarda está no fator humano que fez dela farta, forte e fiel, sendo por isso necessário inverter o rumo, mesmo partindo de uma difícil realidade de decadência. Nesse sentido, importa escolher as melhores soluções para que se possa restaurar a esperança, pois o futuro não existe, de tal forma ele está ofuscado pelo presente e passado recente.

Porém, sabemos que as decisões não serão fáceis, pois exigem de todos um esforço adicional de libertação do natural egocentrismo que, em determinados momentos, tornou a Guarda uma fortaleza quase inexpugnável, mas que não pode ter espaço na Guarda do futuro.

Afinal, os guardenses não querem a Lua, apenas querem que, na Guarda, o FUTURO não tenha medo de existir.

Henrique Monteiro

* Presidente da concelhia da Guarda do CDS-PP

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