Na pequena povoação de Nabais (concelho de Gouveia), localizada em plena vertente norte da Serra da Estrela, a caminho de Folgosinho, realiza-se uma festa na última semana de Maio em honra de Nossa Senhora do Coito. Curiosamente, uma capela de Nabaínhos, freguesia de Melo, construída nos séculos XV ou XVI tem como padroeira a Senhora do Coito. Como se terá formado este culto? Qual terá sido a sua origem?
Embora se possa pensar em explicações mágico-religiosas relacionadas com antigos rituais de fertilidade, a origem deste nome terá uma origem meramente profana. Estará relacionado com a existência de uma propriedade senhorial com certos privilégios. Com efeito, a aldeia de Nabais seria, na Idade Média, um couto, ou seja, uma terra imune pertencente a um fidalgo. E o maior fidalgo da região na Idade Média era o senhor de Melo, uma povoação vizinha de Nabais, terra de Vergílio Ferreira. No século XIII, em pleno reinado de D. Afonso II, a povoação foi doada ao homem que viria a fundar a casa nobre de Melo, o cavaleiro D. Men Soares de Melo. Junto à povoação edificou o seu paço cujas ruínas ainda podem ser vistas na encosta da Serra.
As cartas de couto eram concedidas pelos reis aos membros da nobreza, aos mosteiros ou às igrejas. O proprietário de uma terra coutada podia exercer o domínio pleno sobre o terreno e sobre os homens relativo à justiça, à cobrança de impostos entre outros. As cartas de couto foram muito frequentes entre os séculos XI e XIII e os funcionários reais estavam proibidos de entrar nessas terras, os moradores estavam isentos do servir no exército real ou de pagar qualquer multa ao fisco real.
Em geral, um couto correspondia à área de uma paróquia como parece ter sido o caso de Nabais. A tradição oral popular terá identificado o nome da senhora da paróquia com a natureza jurídica da terra onde se invocava a senhora. A palavra com origem na palavra latina “cautum” (guardado, garantido) passou para o português como couto, coto ou coito. Muitos outros “coitos” foram semeados pela Beira Interior. Por exemplo, na freguesia do Salgueiro, concelho do Fundão, encontramos o Coito de Cima e o Coito de Baixo. Nas proximidades da Guarda, em Santana da Azinha, outra propriedade aparece designada como Coito.
Voltando ao “coito de Nabais”, a história da aldeia não se esgota no “coito” medieval. Os sinais presentes em muitas casas da zona antiga assinalam a forte presença judaica e cristã-nova nesta povoação serrana desde tempos muito recuados. As inúmeras cruzes gravadas nas pedras de entrada das habitações assinalam que ali havia cristãos e não “marranos”. Num tempo de profunda intolerância religiosa, acirrada pelo Tribunal do Santo Ofício a partir do século XVI, deixou marcas em todas as povoações da Serra da Estrela, de Seia ao Fundão. Em Nabais, o “Pátio Judeu” com as suas cruzes e as datas do século XVII perpetua a memória dos judeus, depreciativamente chamados de “marranos”.
Por: Manuel Sabino Perestrelo