http://www.youtube.com/watch?v=M3g-xtkEaPU • Wagner, Lohengrin, Marcha Nupcial
Após anos de experiência de estudo da mente das pessoas para entender as crianças, o que me levou a criar o conceito de «mente cultural», isto é, a cultura e os hábitos orientam o comportamento das pessoas, começo a pensar na não existência do pensamento racional. Se todos entendem a vida como é entendida pelos vizinhos e parentes, acaba por não haver autonomia nas decisões. Ideia que me parece pouco provável que aconteça. Todos sabemos que nascemos para sermos livres e autónomos, respeitando os direitos de outros com essa semelhante autonomia e liberdade.
Quando pensei no conceito e o defini em vários livros, especialmente no primeiro, de 1990 b: A construção social do insucesso escolar, onde, ao longo do capítulo 8, intitulado a Sabedoria das crianças, debato sobre a origem do saber, comprovo também a capacidade de pensar de serem livres e autónomos. Liberdade e Autonomia que não se aprendem na escola mas na interacção com os outros. Outros que, entre si, vão imitando as palavras que ouvem, as formas de vestir, o respeito aos mais velhos… Em nenhum livro encontrei ou descobri ideias sobre a nomeada autonomia. Autonomia que é tão curta que foi preciso regulá-la e escrevê-la nos textos sagrados, como na Bíblia (de qualquer confissão religiosa) e no Tora dos judeus, e em textos civis, como a Declaração da Independência das colónias britânicas do ultramar, submetida, pelo Abade Sieyés, à primeira Constituição Francesa de 1791, sob o título Declaração dos Direitos Humanos.
A dúvida, neste tipo de argumentos, é saber qual é a necessidade de escrever sobre autonomia e liberdade. Em minha opinião, nasce desse principio praticado pelas pessoas: a procura de autonomia. Porém, não reparam que a liberdade individual não existe, cada um de nós precisa do outro para confeccionar o que um eu não sabe fazer ou não tem tempo, como definiu o presbiteriano Adam Smith, em 1776, no seu texto de dez volumes, defendendo a inclinação ou proclividade de todo o ser humano para o trabalho, ideia que nem tem base nem princípio, excepto os livros da sua fé e a mitologia do jardim do Éden, ao serem expulsos homens e mulheres do sítio ideal do não trabalho, para a terra que, como diz o livro do Génese, capítulo 1, versículo 10: o ser humano teve que começar a escavar para se sustentar. A liberdade, a autonomia, a procura da independência individual acaba no dia que começa, quando o casal apenas vivia para se distrair, sem muitas ideias novas. Como é natural, esta ideia é uma metáfora bíblica para explicar a escravidão de Israel ao Egipto, até às suas lutas de hoje pela faixa de Gaza ou com o Egipto pelo livre-trânsito pelo Canal do Suez, controlado até há poucos dias por Mubarak. Se pensarmos nestes dados e procurarmos nas suas origens, como a metodologia de separar o ilusório dos factos concretos, podemos entender que esse anseio de autonomia é apenas a contradição da falta dela.
O que, de uma outra maneira, pode-se afirmar, para encontrar a decisão acertada aos nossos desejos de autonomia, é preciso construir uma maneira ou estrutura para as relações entre pessoas. Estrutura encontrada por Marx, em 1857, nos seus textos sobre a mais-valia e a acumulação de capital; tal como na relação de poder (nomeadamente económico), por não haver posses entre a população que trabalha por um ordenado, e a população que vive do trabalho de outros.
Chegados aqui, parece-me necessário definir o que é o trabalho. Inclinação humana, de acordo com Smith, influenciado pelo Génesis, mas também a transformação da matéria em bens comerciáveis, transacções de produtos de consumo material, comestíveis e a necessária poupança para investir moeda em moeda que, acumulada, estabelece a forma capitalista de produção: se não há moeda, não há enriquecimento, como acontece hoje em dia connosco e a falta de pessoas empenhadas em investimentos que rendam riqueza. Émile Durkheim, em 1893, no texto A Divisão Social do Trabalho, descobre que factualmente havia duas maneiras de viver: de forma mecânica e de forma orgânica. A primeira corresponde às convenções que a população faz, para entender e viver harmoniosamente, debaixo dos seus próprios ditados, que são aceites por todos e acrescentados com a passagem do tempo. Um desses ditados é o que intitula o texto que escrevo: quem pensa não casa, quem casa não pensa. Um adágio, diria eu, irónico para advertir das venturas e desventuras da vida a dois. Vida possível se a autonomia é procurada em conjunto, se existe amor, paixão e respeito, ou se não houver uma ferida da infância que faz do adulto esse ser que pretende ser autónomo, mas não consegue. É evidente que ninguém pode acreditar nesse ditado, excepto se for parvo ou pueril, por outras palavras, organiza o pensamento racionalmente e, de forma paralela, vai brincando com as tristezas da vida. Se se pensa, não casa, é apenas esse adágio referido para que o casal escolha, como diz Julia Roberts: o matrimónio do meu melhor amigo. Ela tinha medo de amar e ser traída, facto comum na geração que segue a nossa. Tenho afirmado e defendido noutros textos, que os que se amam vivem primeiro juntos e casam depois, quando é provado que há respeito entre ambos, seja qual for o tipo de matrimónio. Há tantos hoje em dia! O Presidente da República acaba de promulgar uma lei debatida no parlamento, sobre a realidade da transexualidade. Assim, não sabemos com quem casamos, apenas os que praticam estas formas de acasalamento, o sabem e podem explicar.
A forma orgânica referida por Durkheim, é a subordinação à lei e ao direito, que regulamenta a solidariedade entre os seres humanos. Solidariedade ou acudir sempre ao próximo, como o autor, socialista, costumava fazer. Durkheim não tinha medo de amar, tinha, sim, medo de sofrer, e foi assim que faleceu: pela morte do seu filho André na Grande Guerra de 1914-1918, como muitos dos seus discípulos. Cansado já, faleceu ainda muito novo, aos 59 anos, em Paris.
Casar, não casar, é um ditado, sim senhor, mas ninguém se orienta por ele, excepto os que têm medo de amar, como a personagem que encarna Julia Roberts no filme referido.
Certamente, o ditado mencionado está endereçado para animar as pessoas para o casamento. Quem não casa, é evidente parecer ser uma pessoa que não pensa, ou simplesmente segue os exemplos dos outros. Quem casa e deixa de pensar, cai na tramóia de não saber sustentar a sua família. Quem não saiba, não merece acasalar, o que seria da sua família?
Como todos os ditados, este tem duas interpretações, como diria Roman Jakobsen: os que seguem o ditado por tradição, os que o ignoram porque, já casados, com uma prole atrás de si, pensam como viver, o seu próprio destino e o de cada filho. O matrimónio tem as suas etapas: a da juventude e paixão, a de criar crianças, a da desilusão.
Actualmente, pode haver muitas formas de casamento. Mas o que me interessa dizer, é que se há um que manda e outro deve obedecer, nem divórcio existe, porque o casamento é feito pelo amor ao outro e o divórcio não rompe esse vínculo.
Confesso que casei, criámos descendentes, o divórcio aconteceu e eu continuo feliz dentro da vida de casado, por existir uma senhora que vela por mim. Dela foi a ideia do título, a explicação é minha. De certeza, ao colocar o meu português de forma correcta, ideias novas virão que eu aceito com prazer e agradecimento.
O desenho que acompanha o texto, ilustra o meu temor a mais uma relação que pode acabar. Ser-me-ia insuportável…
Por: Raúl Iturra