Um dia, na margem dum rio, nasceu um crocodilo com trinta irmãos. Um dia comerá quase tudo o que perto de si se mova. Grande e pesado o crocodilo assustará os rios onde se espoja, se alimenta, se reproduz. Um dia a margem do rio estará mais estreita, com menos água e todos os crocodilos se defenderão mergulhados na areia. Defendem-se do calor que vai secando as margens de modo medonho. Ao rio chegarão as ondas do petróleo da BP e de outros erros humanos. E acusaremos as empresas e as pessoas que precisam do petróleo. E julgaremos os criadores dos erros que foram também aqueles que nos permitiram avançar, proliferar, ser mais e ser maiores. E acharemos horrendas as plataformas de petróleo e as centrais nucleares e os cabos eléctricos e tudo aquilo que antes era arcaico e menos evoluído. O Mundo vai evoluindo e criando alternativas e melhorando-se em passos ténues e por vezes gigantescos. Os crocodilos sem MP3, sem telemóvel, sem televisão não antecipam a tragédia que aí vem e a única coisa que a mãe vê é que de trinta filhos não chega nenhum à adultez. Um dia na margem do rio não nascerá nenhum crocodilo. Um dia não há margem do rio porque não há rio. Um dia desenhamos desculpas e acusações que não servem de nada. Mas também é verdade que as margens dos rios vão sendo forças de uma evolução que não sabemos para onde vai. Enquanto os crocodilos nascem nas margens dos mesmos rios e comem os mesmos animais, nós fomos mudando os rios, fomos proliferando em quantidade, reduzindo os rios e amplificando os desperdícios. Os homens não têm um plano de evolução, não têm uma estratégia de desenvolvimento, simplesmente evoluem de modo caótico e em favor de mais velocidade, mais riqueza, mais distância da natureza. Um dia haverá um mundo com menos rios e menos homens e nessa altura não haverá crocodilos além dos parques criados por homens para nos lembrar que um dia eles existiram junto de correntes de água que eram rios.
Por: Diogo Cabrita