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A homenagem da UBI ao «engenheiro social»

José Sócrates esteve na cerimónia de atribuição do grau “Honoris Causa” a António Guterres

António Guterres recebeu, na última sexta feira, o grau Honoris Causa pela Universidade da Beira Interior (UBI) «muito comovidamente», de voz embargada, e congratulou-se por recebê-lo na área das Ciências Sociais e Humanas, por se considerar «um engenheiro social». O antigo primeiro-ministro socialista, que deu luz verde à criação da Faculdade de Ciências da Saúde na UBI em 1998, disse não atribuir a si próprio os méritos, falando antes numa «caminhada comum» que fez com a instituição «pela valorização da cidade, da Beira Interior e das suas gentes».

O Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados foi distinguido durante as comemorações do 24º aniversário da UBI – que coincidiu com o dia em que completou 61 anos de idade – , numa cerimónia que decorreu no grande auditório daquela faculdade e juntou várias personalidades do panorama regional e nacional, entre as quais José Sócrates. «Quero felicitar a UBI não apenas pelo seu aniversário, mas sobretudo porque, como sempre desejámos, é hoje de facto um dos motores essenciais para o desenvolvimento não só da cidade, como da região», afirmou o homenageado, perante um auditório completamente cheio. O antigo chefe de Governo, que teve como padrinho Bruto da Costa, disse que «todos temos a obrigação de pôr a render, ao serviço da sociedade em geral e também dos mais carenciados, os “talentos” que recebemos». «E este [grau Honoris Causa] é um talento que terei de pôr a render», acrescentou.

O antigo primeiro-ministro reiterou na cerimónia que não tenciona regressar à política portuguesa: «Tenho a firme convicção de que não voltarei ao exercício de funções políticas», disse. Num discurso onde abordou também a temática da acção humanitária e o conceito de justiça global, António Guterres aproveitou para lançar um apelo: «Em momentos particularmente difíceis, como o que atravessamos, é essencial que todos nos empenhemos em reabilitar a política e em valorizar o papel daqueles que dedicam a sua vida ao exercício de funções políticas». O reitor da UBI destacou, por sua vez, que a instituição só distingue com este grau «personalidades eminentes de reconhecido mérito». «Mais não fazemos do que render uma justa e reconhecida homenagem, que também nos prestigia, a um dos maiores estadistas do nosso tempo, na esfera nacional e internacional», afirmou João Queiroz.

O reitor enalteceu «o contributo de António Guterres para um projecto estruturante, actualmente com grande impacto na região e no país» e que conheceu «desenvolvimentos marcantes» na cerimónia – em que foi assinado o contrato de confiança da instituição para os próximos quatro anos e ainda o do programa Inovida, em que se insere a UBI Medical. O Inovida, um projecto de 12 milhões de euros, é «uma oportunidade de lançar um projecto inovador e diferenciador no panorama nacional e internacional», frisou o reitor. Segundo este responsável, este “cluster “ da saúde, a instalar nos terrenos da faculdade, «consubstancia a criação de um espaço de excelência no sector, envolvendo as vertentes de incubação de empresas, de investigação e de conhecimento com a ligação privilegiada às instituições da região». No projecto, entram os hospitais da Covilhã, Guarda e Castelo Branco.

Coube ao primeiro-ministro, que se deslocou à Covilhã para assistir à homenagem a António Guterres, encerrar a cerimónia. José Sócrates recordou a decisão tomada em Conselho de Ministros em 1998, onde, para além dos dois, estiveram Mariano Gago e António Costa, ambos presentes também na cerimónia. José Sócrates realçou que foi António Guterres que disse que era altura de dar «uma oportunidade» ao interior. «Valeu a pena correr esse risco», acrescentou. Na cerimónia estiveram vários presidentes de Câmara da região, nomeadamente da Covilhã, Castelo Branco, Guarda e Manteigas, entre outros, para além de deputados à Assembleia da República dos dois distritos, governadores civis e responsáveis pelas diferentes unidades hospitalares.

Mais 200 vagas para Medicina

O número de vagas para acesso ao curso de Medicina da Universidade da Beira Interior (UBI) vai crescer até 200 nos próximos três anos, anunciou durante a cerimónia o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. O curso na Covilhã tem actualmente 115 vagas, número que «crescerá 20 por cento já no próximo ano lectivo», adiantou Mariano Gago. «A ministra da Saúde autorizou-me a dizer aqui que encontrará neste espaço de tempo a resolução de problemas de integração em hospitais e centros de saúde dos novos estudantes no ciclo clínico», acrescentou o ministro. Antes, o governante ouviu o reitor da instituição pedir medidas para «o aumento da capacidade formativa de internos da especialidade, quer pela reavaliação da idoneidade de serviços, quer pela abertura de vagas de internato médico em serviços da região já com idoneidade».

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• Entrevista a António Guterres

«Tenho uma profunda esperança no futuro da região»

P – Como conhecedor desta região, muito pela ligação que tem às Donas, considera que a Beira Interior se desenvolveu nos últimos anos?

R – Acho que continuamos a assistir a um ritmo de desenvolvimento muito interessante nesta zona. É evidente que as infraestruturas que foram construídas, como o regadio da Cova da Beira, o desenvolvimento da universidade, as auto-estradas ou a modernização da linha de caminho-de-ferro, contribuem para que deixe de ser uma região que está numa ponta para passar a estar no centro da ligação entre Lisboa e a Europa. Tenho uma profunda esperança no futuro da região e nas pessoas que aqui trabalham, bem como nas que dirigem os destinos políticos, económicos e sociais da região. É com muita satisfação que venho aqui e percebo que está melhor do que quando eu aqui trabalhava politicamente.

P – No caso do regadio, há ainda blocos por concluir, apesar de enquanto primeiro-ministro ter estimado que estaria pronto em 2006…

R – Muita coisa se foi fazendo. Há aspectos que por vezes sofrem alguns atrasos. Mas, se olharmos globalmente para a região, acho que temos que reconhecer que deu grandes passos, mesmo depois de me ter ido embora do Governo. E não quero, de maneira nenhuma, atribuir-me méritos.

P – O regadio ainda virá a tempo de “salvar” a agricultura da região?

R – Não conheço em detalhe a situação actual, mas o regadio já tem muita coisa feita. O que desejaria é que ele pudesse dar o maior contributo possível. Espero que o que falta seja feito na altura considerada mais adequada.

P – A região corresponde àquilo que imaginou?

R – A nossa imaginação nunca corresponde à realidade. Esta região tem pujança, que é sua e própria, que tem a ver com a capacidade de realização das gentes desta terra.

P – Numa altura em que há cortes de investimento um pouco por todo o país e também na região, o que diria aos beirões que continuam a exigir obras?

R – Neste momento é óbvio que as possibilidades do país serão limitadas em termos de investimento. Há que definir bem as prioridades e compreender que, quando se pode fazer só 50 e não 100, há que ter a garantia que as 50 que decidimos fazer são as mais importantes e as que podem ter um maior impacto para o futuro.

P – É um “embaixador” da UBI, tendo em conta também a distinção que foi concedida?

R – Creio que a UBI não precisa de embaixadores. O melhor embaixador é o seu prestígio e o seu êxito, nomeadamente o da Faculdade de Medicina. Muita gente dizia que uma faculdade aqui não iria para a frente. E aqui está a Faculdade de Medicina com uma pujança enorme e uma qualidade extraordinária. Naturalmente que tudo o que puder fazer para apoiar esta universidade, fá-lo-ei com todo o gosto. É naturalmente muito comovente para mim receber esta distinção da universidade, que é a universidade da zona onde os meus pais nasceram, onde tive sempre actividade política e de uma região à qual sempre me dediquei muito profundamente.

A homenagem ao antigo primeiro-ministro foi o ponto alto do Dia da UBI

A homenagem da UBI ao «engenheiro social»
A homenagem da UBI ao «engenheiro social»

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