Se calhar o melhor é não perceber a minha desilusão, não ler este artigo e não chegar ao fundo das razões que converterem um sistema eficaz e relativamente barato num caos de soluções sem saída. Portugal quando me formei em Medicina possuía um sistema bastante barato de saúde com base no princípio que era um dever do Estado oferecer a todos um determinado grau de protecção em saúde. Hoje o caos instalou-se e temos um sistema cheio de dívida e caro. O Sistema Nacional de Saúde encontrou nas suas insuficiências as portas de uma paradigma interessante que veio a romper nas mesmas portas ineficientes do paradigma anterior. O que falha na saúde em Portugal? 1- Os salários dos decisores são ridículos e afastam os melhores de prestar contributo. Um médico como eu recebe hoje 2078 euros ilíquidos e portanto 1500 euros por 35 horas de trabalho semanal com 12 de urgência. Assim é porque não está em exclusividade e o Governo cancelou a progressão nas carreiras há quase uma década. Imaginem o que aufere um chefe de serviço sem exclusividade. Rondará os 3000 euros ilíquidos. A responsabilidade e a decisão devem premiar-se 2- A exclusividade não trouxe nenhuma eficiência acrescida para lá de alguns escassos exemplos, mais ou menos propagandeados. A exclusividade foi uma reforma como todas as outras de pós 1985: um caminho sem estratégia e sem definição organizadora. Penso que com Leonor Beleza o sistema encareceu e não se melhorou. A exclusividade ou é para todos, privados e públicos, ou não é para ninguém. 3- As reformas realmente determinantes careciam da coragem e da força de decidir que só quem é devidamente pago e tem força moral seria capaz de realizar. Estamos a falar de pessoas e não de programas de intenções ou sistemas informáticos. O decisor – o líder – tem que liderar e ter mecanismo que lho permitam. Escolher caminhos obriga a envolver pessoas que devidamente remuneradas e apoiadas financeiramente transportam consigo revoluções de eficiência. Mede-se a qualidade pela produção, pela organização e nunca menos importante, a satisfação dos utentes da performance do sistema. As reformas têm de ter protagonistas. 4- Que mecanismos de saúde podem realizar-se sem sistema de consultas? A consulta clínica é a base e a porta principal dum bom e funcional sistema de saúde. Mecanismos como a triagem de Manchester existem para articular urgências apinhadas. Mas a urgência não deve ser a porta do sistema de saúde. Este sistema de correcção das urgências foi a reforma pelos alicerces. A casa caiu. E tinha de cair pois as reformas devem ser no sentido de trazer melhor e mais qualidade aos utentes. O utente da saúde, o doente, precisa antes de tudo de ser consultado, analisado na sua queixa e submetido a estudo complementar, diagnóstico e terapêutica. Mas é logo aqui que tudo se torna difícil no sistema português. Como conseguir uma consulta sem entrar numa urgência? 5- As quintas de poder e as duplicidades de oferta. Há serviços a mais em Portugal com meios de menos e por vezes um quadro de pessoal envelhecido. Agora responde-se com 8 faculdades de Medicina e a produção de médicos por todo o lado. Alguém avaliou a formação dada nas faculdades? Os curricula administrados? a definição do clínico que nos interessa? Alguém se perguntou se temos médicos a mais e desorganização a rodos? Uma cidade como Coimbra precisa de tantas unidades de atendimento médico? Precisa de dezenas de aparelhos de TAC e mais que uma PET? De quantos médicos precisa Portugal? Que doenças são mais frequentes entre nós? Os médicos ao preço da levedura trazem vantagem? 6- A definição estratégica é pois a mãe de todos os erros dum sistema que explode em dívidas e se encarece sem qualquer solução à vista. O futuros dos médicos é mau dentro de 6 a 7 anos, o dos utentes é muito mau nos próximos três a dez, e o mau ambiente nas instituições de saúde poderá conduzir a lugares certificados e acreditados onde nada se produz e o ambiente é péssimo.
Por: Diogo Cabrita