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A Escola da Vida

Entrementes

É hábito fazer destes últimos dias do ano época de balanço. Comenta-se o acontecido ao longo do ano, fazem-se as mais díspares análises e, sistematicamente, fazem-se votos para que o Ano Novo traga algo de… novo.

Eu, que sou professor há mais de duas décadas, dei por mim a pensar nas mudanças, evoluções e recuos a que já assisti no sistema de ensino português. Ao longo dos anos as diversas equipas ministeriais, por certo com as melhores das intenções, lançaram medidas e contra-medidas, reformas mais ou menos sentidas, legislação a mais variada.

No entanto, parece-me que todos os responsáveis cometeram o mesmo pecado: deixaram que a Escola, ou se preferirem, o sistema de ensino, se afastasse mais e mais da sociedade. Não há hoje maior mentira do que usar o velho chavão segundo o qual a escola deve ser o reflexo da sociedade Senão vejamos:

Nos dias que correm, quando a sociedade se aproxima cada vez mais do princípio darwiniano da sobrevivência dos mais aptos numa competição desenfreada a roçar o irracional, a escola não prepara, como deveria, cidadãos responsáveis e dotados de competências para enfrentarem o mundo do trabalho. A generalização da escolaridade obrigatória veio trazer um nivelamento por baixo do ensino. Esta é hoje uma realidade insofismável e que pode ser observada em qualquer escola do país, estejamos no litoral ou no interior.

Os níveis de exigência são hoje incomparavelmente mais baixos do que há uma, duas décadas, o que fez disparar para patamares impensáveis as taxas de sucesso que tão bem nos fazem ficar na fotografia estatística junto com os nossos parceiros europeus.

A cultura da responsabilidade e do trabalho como factores de afirmação da pessoa enquanto tal e propiciadores do sucesso individual, caiu em desuso. Diga-se, em abono da verdade, que não é a escola a única culpada. Também as famílias têm a sua quota-parte quando, não raro, se abstêm de educar para os valores e, despejam sobre os ombros da escola uma responsabilidade que lhes pertence. Que há factores que hoje levam a que se tenha cada vez menos tempo para estar e viver a família enquanto tal, todos sabemos. Urge agora é que saibamos utilizar o pouco tempo que temos e o racionalizemos em função de interesses comuns e que não “compremos” os nossos filhos com mais uma Playstation, um portátil, um telemóvel e mais um ror de coisas que, se é verdade que podem constituir uma ferramenta tecnológica importante, não é menos verdade que podem ser potenciadores de comportamentos individualistas que em nada ajudam a construção do carácter do jovem adolescente.

O mesmo jovem que depois, na escola, tende a vivê-la da mesma forma, sem querer assumir a sua condição de aluno, com os seus direitos mas também, e esta é a parte fundamental, com os seus deveres.

Na escola onde lecciono, no ano passado uma aluna ucraniana, quando a questionei sobre as maiores diferenças que via entre o sistema de ensino do seu país de origem e o nosso respondeu-me taxativamente:

– Sabe professor, é tudo uma questão de R’s:

Respeito pela escola. Lá seria impensável um aluno estragar os livros que lhe deram ou danificar propositadamente material escolar.

Responsabilidade. Alguns dos meus colegas nem sequer apontam as datas dos testes, não fazem trabalhos de casa, não estudam…

Sintomático, não?…

Por: Norberto Gonçalves

Comentários dos nossos leitores
Samuel Antic santicaciques@gmail.com
Comentário:
O seu diagnóstico, caro colega, até estaria correcto se não tivéssemos sido “governados” nos últimos (quase) cinco anos, pela dupla Sócrates/Maria de Lurdes. Este facto, rouba-lhe o discernimento necessário para lhes atribuir as responsabilidades que lhes cabem, pois é por demais conhecida a sua ligação umbilical ao partido dos ditos e esta coisa da ´”partidarite” provoca, habitualmente, dependência, fortemente redutora da capacidade de análise, que o seu texto bem demonstra. Sabe, tão bem como todos nós, dos estragos que causaram à Educação e não apenas à Escola, mas também a toda a sociedade. Nem as actuais medidas, tendentes a eliminar muitas das poucas vergonhas levadas a cabo nesse conturbado período, conseguirão fazer desaparecer as marcas negras deixadas, sendo que algumas são mesmo irreversíveis, como é o caso do abandono de milhares de colegas nossos, e a certeza, por parte dos alunos, de que não necessitam trabalhar. E nem sequer lhe vou falar da guerra suja que nos moveram. Basta lembrar-lhe a legislação, produzida naquele período, que pode impedir a reprovação automática, de um aluno mesmo com uma dúzia de níveis negativos. E as “Novas Oportunidades” ou antes as “Novas Trafulhices”, como diz o professor Medina Carreira, que o colega também sabe que o são, tanto ao nível dos conhecimentos adquiridos, como ao mau exemplo dado aos nossos alunos e que eles já usam para se recusarem a trabalhar. Aliás, isso é reconhecido no seu texto, quando fala do nivelamento por baixo, seja no interior ou no litoral. Reconhecendo esse desnivelamento, não pode, num artigo desta natureza, deixar de referir, o enorme “contributo”, dado pela referida dupla, para o caos instalado na Escola, o que só pode ser entendido como uma tentativa de branqueamento da sua nefasta actuação, durante aquele negro período, e isso os professores não aceitam.
 

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