Começou quinta-feira no Tribunal da Guarda o julgamento de Marcelo Fernandes que, no ano passado, assassinou a mulher com uma arma branca. Numa situação bastante rara no país, o arguido está a ser julgado por um tribunal de júri, constituído por quatro cidadãs mais o colectivo de juízes.
Ao tribunal de júri podem concorrer pessoas com mais de 18 e menos de 65 anos, cuja capacidade e idoneidade são posteriormente analisadas, bem como o facto de nunca terem estado presas, nem possuírem incompatibilidades como, por exemplo, serem detentores de cargos em órgãos de soberania. Deste modo, será a maioria do total de sete jurados a proferir a sentença. Marcelo Fernandes, cidadão brasileiro, mas filho de portugueses naturais de Chaves, está acusado dos crimes de homicídio qualificado, cuja moldura penal é de 12 a 25 anos, e de violência doméstica. A defesa sustenta que o que se passou deve ser considerado homicídio privilegiado, à luz do artigo 133.º do Código Penal que sustenta que «quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de um a cinco anos».
O caso remonta a Novembro de 2008 quando Sandra Fernandes, de 31 anos, foi esfaqueada até à morte pelo marido durante uma discussão. O crime ocorreu no apartamento onde viviam, na Rua Gago Coutinho, enquanto as filhas do casal dormiam no quarto ao lado. A vítima sofreu seis golpes nas costas e no peito, tendo o arguido também sofrido vários golpes profundos nas mãos, tendo sido transportado ao Hospital Sousa Martins. O casal era oriundo de Chaves, mas encontrava-se a residir e a trabalhar na Guarda desde 1995. A vítima era funcionária da Autoridade para as Condições de Trabalho e o arguido, que confessou o homicídio, trabalhava nas piscinas municipais. José Martins Igreja é o advogado de defesa e, na contestação, a que O INTERIOR teve acesso, sustenta que o casal sempre se deu bem até Outubro de 2008, altura em que, «sem nada que o justificasse, a Sandra alterou o seu comportamento».
O documento fala em «afastamento e frieza» da vítima, que «já tinha um companheiro, se tinha apropriado do dinheiro do casal [num total de 18.250 euros] e já havia procurado advogado para propôr o divórcio». No dia do crime, o arguido constatou que o dinheiro «já não se encontrava numa gaveta de um móvel no sótão» e, ao procurá-lo, encontrou numa carteira da falecida três cartas escritas por outro indivíduo, ficando a «saber que a sua esposa o havia traído e que, provavelmente, lhe haviam tirado o dinheiro». Os acontecimentos posteriores estão agora a ser julgados, sendo que a defesa de Marcelo Fernandes tenta demonstrar que «Sandra perdeu completamente a sua sanidade mental, entrou em total descontrolo sentimental (…) e levou o arguido à prática dos factos que confessa, e dos quais preferia ter morrido a ter morto». Em oposição, o bracarense Lázaro Ferreira, advogado da família de Sandra, adiantou a O INTERIOR que a falecida era vítima de violência doméstica, «pelo menos, desde 2006», confirmando que vai ser pedida uma indemnização cível que ronda os 500 mil euros. O julgamento prossegue dia 17 pelas 9h30.
Ricardo Cordeiro