Começo por vos narrar um facto ocorrido na então (hoje cidade) vila de Trancoso. Deu-se em 21 de Outubro de 1945: esteve amarrado ao pelourinho de Trancoso um homem que foi acusado de roubar três galinhas; para exemplo e castigo foi o “pilha” amarrado ao fuste do pelourinho, pendendo-lhe da cabeça as galinhas que tinha subtraído.
Em Abril deste ano, foi julgado e punido um homem na Maia, também porque “pilhou” duas galinhas, no valor que o expedito Ministério Público calculou em 50 euros.
Enfim, para além das raposas, que são vezeiras na arte de roubar toda a galinha, estes condenados são os “pilha-galinhas” que a D. Justiça, sumária e rapidamente, resolve levar a patíbulo. No caso de Trancoso, onde decerto muitos foram os roubos levados a cabo durante estes séculos de pelourinho, não consta que algum dos criminosos fosse exposto no monumento (e ele tem mais de quinhentos anos!).
Conclusão: os pequenos delitos são sempre punidos e, pela sua pequena monta, relativamente bem punidos. Contudo, os grandes delitos “marinam” nas barras dos edifícios onde uma senhora, de olhos vendados, em romana pose, à entrada, exibe uma espada e uma balança. Quid juris?
Ressalvo, com a devida vénia, a dignidade dos que, na Justiça, pugnam para que esta se cumpra, com desassombro e independência. E vão sendo alguns: se muitos ou poucos, não possuo essa estatística, mas enfatizo a sua existência; mais ainda, persistência.
Não vou citar os casos que estão pendentes neste país nem sequer os nomes (altos nomes) que andam nas bocas do povo e nas laudas dos processos judiciais, porque este mesmo povo já sabe quem são. Vou, no entanto, continuar a lamentar a impunidade de todos estes últimos, possivelmente os “pilha-lagostas”, os “pilha-habilitações académicas” e os “pilha-erários públicos”, na certeza de que cairá, muito tarde que seja, o pelourinho de Trancoso, sem que os veja expostos ao trânsito em julgado da condenação que merecem.
Bem dizia alguém (que não recordo o nome): a justiça actua, por vezes, como as teias de aranha – os insectos pequenos ficam lá presos, os maiores atravessam-nas.
Se César apontava que este rectângulo não se governava nem se deixa governar, hoje diria que no rectângulo muita gente se governa e não se interessa em governar.
Segundo as notícias, as coisas avolumam-se para o lado daquele que alguns portugueses teimam em manter como primeiro-ministro. O homem parece mentir, tal como o Pinóquio, mas o nariz não lhe cresce em comprimento; antes se abatata, como um furúnculo, parecendo um aríete quando se enfurece e invectiva os adversários (principalmente a comunicação social).
Enquanto isso, assistimos aos silêncios de Geppetto perante os fumos de tráfico de influências, conversas duvidosas com amigos igualmente assim, ajudas a Manueis Finos com problemas financeiros, outras tantas a Quins Oliveiras que dominam muito papel impresso em prol da causa, Ongoing’s (oinc! oinc!) dos Vasconcelos (um outro, foi defenestrado na História, como sabeis), Freeport’s que o paciente inglês da congregação já arquivou, para dar o exemplo, e o que mais virá por aí abaixo.
Pelo meio, o passar do testemunho esfarrapado entre PGR e STJ.
O povo, esse, que se deixa enganar (porque quer) descansa e segue o rifão: o que havemos de fazer? Descansar e tornar a beber. Ora, recorrendo a um outro aforismo sertanejo, atrevo-me a sugerir – isto só com pau, corda e chinguiço.
Pinóquio e Geppetto, se bem que feitos de carne e pau, parecem entender-se e ambos, com “cara de pau”, recolhem a língua na boca e deixam que o tempo e o futebol façam esquecer estas escutas e mais escutas, parangonas nos não afectos à causa, língua do soalheiro, espionagem e mais vilanagem.
Favores e mais favores, ninguém já duvida que os vai havendo. E lá vai outro rifão: eu venho do “dá cá, toma” e vou para o “toma, dá cá”; nunca vi “dá cá” sem “toma”, nem “toma lá” sem “dá cá”.
Quousque tandem abutere, Socratilina, patientia nostra?
Por: Santos Costa
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