Dizem os jornais que a Maconde se apresentou à insolvência. Dizem também que no último ano as insolvências (ou falências, como antigamente se dizia) aumentaram em mais de cinquenta por cento. Contam-nos ainda os jornais a falência de um país, a Islândia, logo aquele que gozava de maior qualidade de vida em todo o mundo. Os seus cidadãos, vendo a moeda do país a desvalorizar de dia para dia, gastam as suas economias em bens de luxo. Compram jóias, quadros, carros topo de gama. Neste fogo de artifício final , e suicidário, reproduzem involuntariamente a ideia base de “A Grande Farra” (La Grande Bouffe), um célebre e polémico filme dos anos 70, em que meia dúzia de personagens decidia comer até à morte num festim final. Diria um cínico que em vez de acumularem diamantes melhor fariam os islandeses em armazenar feijões, mas gostos são gostos.
A Islândia arrisca-se a ser a prova de que o nosso estilo de vida é insustentável. E quando digo “o nosso”, finjo por um momento que Portugal entrou na mesma liga de que faz parte a Islândia. A verdade é que não entrou ainda, nem entrará. Se alguma coisa podemos aprender de tudo isto é que o estilo de vida ocidental, do hemisfério norte, assenta em pressupostos que se não podem estender ao resto do mundo e que o mundo não suportará por muito mais tempo. Os nossos hábitos de consumo são possíveis na exacta medida em que são impossíveis para os outros. Se os chineses e os indianos tivessem o nosso consumo de papel higiénico per capita não haveria já florestas em nenhum dos cinco continentes. Se tivessem a mesma ratio de carros por cem habitantes que em Portugal não haveria já petróleo e as alterações climáticas teriam atingido o ponto de não retorno.
As falências, mais do que fracassos individuais, são a prova da insustentabilidade do mundo construído no século XX. Este era baseado em petróleo abundante e barato e no crescimento, aparentemente imparável, do consumo individual. Era um mundo baseado na produção, circulação e consumo de mercadorias. Construíram-se sobre este fundamento teorias políticas (e até religiões, como os cultos da carga que referi há umas semanas atrás), travaram-se guerras e mataram-se milhões de pessoas. Se algum ensinamento nos podem trazer os tempos que correm, é que não vale a pena continuar a produzir se o consumo deixou não só de ser um fim em si mesmo como se tornou mesmo indesejável.