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Bombeiros sem formação certificada

Associação reclama descentralização concelhia das acções da Escola Nacional

«Os bombeiros arriscam-se demasiado. Por não conhecerem alguns dos efeitos do fogo, como o “efeito chaminé” ocorrido em Famalicão, eles realizam manobras que não são as mais adequadas», alerta Sérgio Cipriano.

O dirigente da associação Amigos Bombeirosdistritoguarda.com aproveitou, no passado sábado, a segunda edição das jornadas de reflexão sobre aquele incêndio – que, a 9 de Julho de 2006, vitimou um voluntário da localidade do concelho da Guarda e mais cinco sapadores chilenos – para desafiar a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) e a Liga de Bombeiros a descentralizar, a nível concelhio, a formação base dada aos bombeiros estagiários. Tudo porque a grande maioria dos voluntários não tem aprendizagem certificada. «Apenas quatro mil bombeiros, dos 40 mil existentes no nosso país, a possuem. Os restantes podem ter conhecimentos de combate, mas decorrem meramente da experiência adquirida ao longo dos tempos e de alguma formação interna», considerou. Daí a importância deste tido de iniciativas, que podem contribuir para melhorar os «conhecimentos técnicos» dos “soldados da paz”.

Mas Famalicão também deve ser um exemplo a seguir noutros locais onde os incêndios causaram mortes, como em Mortágua, Armamar, Águeda ou Sintra. «Já que não há formação base, aproveitamos estas jornadas para sensibilizar os bombeiros para os perigos que correm e, se calhar, levá-los a não arriscar tanto no terreno», adianta Sérgio Cipriano, que também acredita no efeito terapêutico do contacto com os familiares da vítima portuguesa. De resto, este ano a iniciativa, promovida em parceria com o Projecto Sérgio Rocha, juntou mais de duas dezenas de elementos de corporações do distrito e até de São Pedro do Sul ou dos Carvalhos (Porto), entre outras, além de uma brigada helitransportada de sapadores chilenos ao serviço da Afocelca, sediados em Penamacor.

Todos quiseram aprender para que a tragédia não se repita, pois o que se passou há dois anos ainda não teve «consequências práticas» na Escola Nacional de Bombeiros (ENB). «Uma das conclusões do relatório deste fogo – sobre a necessidade de formação – ainda está por cumprir», criticou Sérgio Cipriano, sublinhando que a ministrada nas corporações «não se pode comparar à da ENB, que é muito mais avançada, mais técnica e tem o apoio do laboratório de incêndios florestais», dirigido por Xavier Viegas. O catedrático da Universidade de Coimbra e principal especialista português na matéria voltou a guiar os participantes pelo local do fogo e todos constataram que o uso de um “fire shelter” – ou tenda de abrigo – poderia ter salvo a vida dos seis homens. O problema é que esta técnica não está muito divulgada entre os bombeiros.

Sérgio Cipriano acusou ainda a Liga e a ANPC de estarem «mais preocupadas em criar portarias, que não servem para nada». Tudo por causa da obrigatoriedade das 275 horas de serviço e da avaliação dos bombeiros. «Isto faz com que a palavra voluntário deixe de ter significado. Se se simplificassem as coisas não haveria tanta revolta nos voluntários», acredita.

Luis Martins

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