Desde segunda-feira que é proibido cobrar o aluguer dos contadores de água, mas os consumidores do concelho da Guarda não vão escapar a uma nova tarifa na próxima factura. Já a partir de Junho são mais 2,20 euros mensais para pagar por aquilo que a autarquia designou de quota de disponibilidade de serviço. Porém, não se pense que é uma alternativa de última hora, pois existe desde Janeiro de 2006, quando foi aprovada na Assembleia Municipal.
Segundo Vítor Santos, presidente do Conselho de Administração dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento (SMAS), esta quota destina-se a suportar os custos com a criação e manutenção da rede de abastecimento de água até ao consumidor. Um argumento que não colheu junto dos vereadores do PSD, que votaram contra a sua implementação. Ana Manso considerou que a maioria «não pode camuflar a má gestão dos recursos com novos impostos». É que, para a vereadora, esta medida só vai «penalizar ainda mais a situação das famílias e dos consumidores, independentemente do consumo». Nada disso, afirmou Vítor Santos, que negou que a quota venha substituir o aluguer dos contadores. Pelas suas contas, o também vereador garantiu que os consumidores até vão sair beneficiados. «A tarifa relativa aos contadores incidia sobre consumos, esta é fixa. Enquanto a primeira tinha reflexos no IVA e na tarifa de resíduos sólidos urbanos, esta quota não», adiantou.
Recordou, a propósito, que, até agora, aquela tarifa variava entre 2,40 e 3,70 euros. Vítor Santos revelou ainda que o fim da cobrança dos contadores implica uma perda de receitas para os SMAS da ordem dos 500 mil euros anuais, pelo que esta quota de disponibilidade servirá para minorar o prejuízo, suportando a empresa cerca de 55 mil euros. «A alternativa era o aumento de tarifas», acrescentou também, justificando o facto de só agora ser activada com o argumento de «não sobrecarregar o consumidor com tarifas e taxas, se uma estava em vigor, seria ilógico pô-la em prática juntamente com o aluguer dos contadores», disse. No entanto, para dissipar as dúvidas, o responsável socorreu-se da Lei das Finanças Locais e de um parecer da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), segundo os quais os SMAS são obrigados «a terem as receitas suficientes para cobrirem os seus custos». Vítor Santos especificou igualmente que, por se tratar de «uma tarifa e não de taxas», esta alteração não tem que ser aprovada na Assembleia Municipal. «Carece apenas da aprovação do Conselho de Administração dos SMAS e do executivo camarário», disse.
Taxa ilegal
O secretário de Estado da Defesa do Consumidor já disse que será ilegal aplicar uma taxa de disponibilidade de serviço para compensar a perda do aluguer do contador pelos municípios. «Se for para compensar a perda do aluguer do contador é ilegal, se for para outro fim tem de ser justificado, em função dos objectivos que diz prosseguir: construção, conservação e manutenção dos sistemas públicos», afirmou Fernando Serrasqueiro, citando a lei.
No caso de dúvidas, o governante defendeu que os consumidores «têm o direito de fazer valer o seu direito», seja através de uma acção popular ou dos centros de arbitragem de conflitos. «Tem de haver razoabilidade entre a taxa e os serviços a financiar. Se for apenas uma mera troca de nome, sem justificação económica, pode haver dúvidas face à legislação que foi produzida», considerou.
«Cobrança de taxas só é possível se for contrapartida por serviço prestado»
Rui Barreiras, especialista em Direito Fiscal, defende que autarquias têm que explicar qual é o custo desse serviço
A cobrança da “taxa de disponibilidade de serviço” pelas autarquias «pode ser legal se for contrapartida por algum serviço prestado e tem de ser explicada a relação», defende o especialista em Direito Fiscal, Rui Barreiras.
Em declarações à agência Lusa, o autor do novo regime geral de taxas das autarquias locais salientou que ao abrigo da nova lei, qualquer taxa a criar pelos municípios tem de ser fundamentada como contrapartida de um serviço prestado, explicando qual é o custo desse serviço para a autarquia. Rui Barreiras explicou que a aplicação de taxas «tem de ir à Assembleia Municipal para reconfirmar e cumprir esses pressupostos de custo/benefício do serviço, sob pena de a partir de 31 de Dezembro ser ilegal e se tornarem nulas». O especialista defendeu que os consumidores podem recorrer aos tribunais caso se sintam lesados, mas primeiro o particular deve reclamar para a Câmara Municipal, que tem um prazo de seis meses para responder. «A lei deu esse benefício às autarquias. Se a Câmara deixar passar os seis meses, o contribuinte tem as portas abertas para ir para tribunal», disse.
Segundo Rui Barreiras, «acabou a criação de taxas sem justificar a correspondência custo/benefício». A lei 53-E/2006 regula as relações jurídico-tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas às autarquias. Segundo o artigo 4º, o valor das taxas das autarquias é «fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade pública local ou o benefício auferido pelo particular». O regulamento que crie as taxas municipais tem de conter a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, «designadamente os custos directos e indirectos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia», bem como a indicação «da base de incidência objectiva e subjectiva», além do valor ou a formula de calculo do que é cobrado.
«As taxas das autarquias actualmente existentes são revogadas no início do segundo ano financeiro subsequente à entrada em vigor desta lei», salvo se até à data indicada estiverem de acordo com estas disposições, de acordo com a lei que entrou em vigor em Janeiro de 2007.
Luis Martins