A capacidade de persuasão do Luís, iguala o poder de síntese e oportunidade com que nos brinda em cada editorial deste jornal…Está desta forma explicado o porquê da minha presença (mensal) no mesmo.
No GAT, Gabinete de Apoio Técnico da Guarda, onde iniciei a actividade em 1983, cresci como profissional e, integrado numa equipe, empenhada e dinâmica, conseguimos transpor para o papel (projecto) e depois para o terreno (obra) muitas das obras públicas que as Câmaras Municipais do agrupamento materializaram. No início de 2007, no âmbito do PRACE, aquele organismo foi um dos extintos. Coube-me a sorte (porque alguns colegas ainda não sabem onde vão ficar…) de ser integrado noutro organismo a DSR, Divisão Sub Regional da Guarda da CCDRC. Estou a aprender outra forma de exercer a profissão de arquitecto. Foi colocada de parte a execução do projecto, naquele diálogo constante, diário, com o lugar…a atribuição de uma materialidade a um lugar é permanente na função do arquitecto…Passei a ter outro tipo de diálogo, agora no âmbito do ordenamento do território e espero, também, que de forma activa.
Neste turbilhão de ideias e opções, percebi, que escrever nesta coluna, também poderia ser uma forma de exercer a profissão de arquitecto!…
Tenho sido confrontado por alguns colegas, com incidência dos que estão em profissão liberal, da dificuldade em exercerem a profissão. Os mais antigos por alguma concorrência desleal, a par de alguma escassez de trabalho e os mais recentes, juntando a estas o facto de não lhes ser dada oportunidade de mostrarem o seu valor.
O Decreto 73/73 de 28 de Fevereiro, é ainda o único, coisa rara neste país, onde a produção legislativa é uma constante, a regulamentar a qualificação oficial a exigir aos técnicos responsáveis pelos projectos de obras sujeitos a licenciamento municipal. Com o enquadramento dado, um construtor civil diplomado pode projectar até quatro pisos acima do arruamento principal desde que a área total de pavimentos não ultrapasse os 800m2. Percebe-se o desfasamento desta lei com a realidade actual e justifica-se a sua revogação. À época, pela escassez de licenciados, pelo saber fazer acumulado e repetido, pelo menor conhecimento dos materiais e simplicidade de técnicas e ainda pelas exigências legislativas, talvez se justificasse. Actualmente com mais de 20 000 arquitectos inscritos na OA (eu sou o 1890 e, nos primeiros anos de actividade, juntamente com alguns colegas fizemos um trabalho missionário junto das autarquias, sensibilizando para a profissão e a mais valia de integrarem arquitectos nas equipes), com a proliferação de soluções técnicas e materiais, com os desafios e responsabilidades colocados no que à organização do espaço diz respeito, exige-se maior qualificação, especialização e responsabilidade.
E quando se trata de arquitectura os arquitectos são únicos com preparação específica para abordar essa matéria…
A qualidade não se decreta, mas é possível aumentar as exigências de qualificação. E qualidade implica responsabilidade. Quando o decreto 73/73 estiver revogado, podemos passar a exigir de todos os autores de projecto, que assumam toda a responsabilidade sobre o seu trabalho. A aprovação de projectos de arquitectura passará a incidir mais nas implicações urbanísticas e na inserção no local, do que na verificação, quantas vezes miudinha, do cumprimento de disposições legais. O processo de licenciamento deve ser menos burocrático e mais aberto ao debate sobre a construção da cidade. A qualidade da arquitectura não pode dissociar-se da qualidade da construção. Basta olhar para a diversidade de especialidades que incluem um projecto de licenciamento para lá da arquitectura, mas que esta tem de saber integrar (estabilidade, saneamento, acústica, térmica, segurança, sustentabilidade, energia etc.) para nos darmos conta da responsabilidade que cai sobre cada um dos intervenientes, desde o promotor aos projectistas ao construtor e a cada um dos operários… Todo o sector da construção merece (exige) qualificação profissional. A revogação do 73/73, não implica o fim cooperativo de qualquer classe, antes pelo contrário vem repor ordem e responsabilidade e, em simultâneo, criar uma diversidade de opções para os que hoje trabalham ao seu abrigo.
Gostaria de terminar com uma referência do professor Alexandre Alves Costa, em relação a esta problemática: “A entrada dos cursos de arquitectura para a Universidade representou a consideração da sua autonomia disciplinar, diferente da de qualquer outra disciplina e a necessidade de fundamentar aquilo que é específico e insubstituivelmente, da responsabilidade do arquitecto…O que, a engenheiros e arquitectos, falta, muitas vezes, é um entendimento inteligente e culto da inevitável divisão de tarefas, que, por se complementarem reciprocamente, não permite exclusividade a nenhuma das partes: do edifício, às pontes (a que gostaríamos de poder continuar a chamar obras de arte) até à cidade.”
Por: Aires Almeida *
* Arquitecto, inicia colaboração mensal.