A situação do serviço de Urgências do Hospital Sousa Martins, na Guarda, está «tão grave que todas as pessoas que se incomodam com o país devem estar muito preocupadas com aquilo que se está a passar». Quem o diz é Adelaide Campos, diretora do serviço.
«A pior perda que nós, sociedade, podemos ter neste momento é a perda do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e ele está muito próximo do colapso, por incapacidade das estruturas [Governo] resolverem ou tentarem criar um diálogo com as pessoas que estão a usufruir dos seus direitos», alertou a médica na segunda-feira. À semelhança do que aconteceu na semana passada, está já confirmado que durante o mês de outubro a urgência guardense não terá medicina interna «todas as sextas, sábados e domingos», prevendo-se que a partir de 1 de novembro haja também constrangimentos na Cirurgia e Anestesiologia, «que consequentemente afeta o quadro de Cirurgia, Pediatria, de tudo…», lamenta Adelaide Campos. Nestes dias os doentes serão transportados para o Hospital de Viseu e para o Centro Hospitalar e Universitário da Cova da Beira, na Covilhã.
«Isto é um acumular de volume de doentes que dificilmente irá conseguir resolver-se», sublinhou a cirurgiã, que lembrou que somos uma região com muitas pessoas institucionalizadas que «vão necessitar de cuidados importantes dentro de dias, assim que comece o frio. Vão duplicar e triplicar as infeções respiratórias, estas pessoas vão precisar de grande apoio do Serviço Nacional de Saúde que, neste momento, não está em condições nem com atividade capaz de suprir essas falhas».
Adelaide Campos reconheceu que a Guarda «é apenas um peão deste jogo de xadrez que é o SNS em toda a sua abrangência», mas avisou que se está a «assistir à degradação completa da estrutura funcional e da assistência médica» em Portugal. Também o executivo guardense se manifestou preocupado com a situação vivida no Hospital Sousa Martins. Numa declaração lida na reunião do executivo da última segunda-feira pelo presidente da Câmara, Sérgio Costa, os autarcas da região consideraram que a Urgência, que esteve à «beira de fechar» no fim de semana, «não pode continuar na corda bamba». Os subscritores reconheceram também que o serviço «está no fio da navalha» e apelaram «a todos os agentes para que façam tréguas, se sentem à mesa e dialoguem». O hospital da Guarda integra a Unidade Local de Saúde da Guarda, que tem uma área de abrangência com 160 mil habitantes.
Ordem dos Médicos defende criação de novo SNS
O bastonário da Ordem dos Médicos defende a criação de um novo Serviço Nacional de Saúde para acompanhar a evolução e a modernização da sociedade, apostando numa reforma de fundo. «Temos uma população muito mais envelhecida e mais exigente do ponto de vista do cuidado. Temos uma ciência, uma tecnologia e uma medicina que evoluíram muito nas últimas décadas, mas parece que os nossos governantes olham para o SNS como há 40 anos», afirmou Carlos Cortes.
Segundo o responsável, a intervenção na saúde tem-se resumido a «pequenos remendos e pensos rápidos, que não resolvem absolutamente nada, apesar de no momento parecerem ser uma solução». Por outro lado, o ministro da Saúde considera que uma solução para o problema poderá ser o funcionamento rotativo dos serviços de Urgência hospitalar, há muito implementado nalgumas zonas do país. «No âmbito das Urgências metropolitanas do Porto já há funcionamento rotativo nos hospitais. É assim há mais de uma década, sem que tenha causado nenhum problema às pessoas», afirmou, a título de exemplo, Manuel Pizarro, admitindo que esse modelo possa ser replicado noutras zonas do país. Está marcada para esta quinta-feira uma reunião da tutela com as estruturas sindicais dos médicos, um encontro que surge após o CEO do SNS, Fernando Araújo, ter reunido com os diretores das Urgências hospitalares.