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Competitividade e custos

Menos que Zero

Em entrevista a vários jornais europeus, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet , defende o corte nos custos unitários de trabalho como forma de recuperar a competitividade da economia europeia. Para Trichet, esta redução de custos passa pelo aumento da produtividade, mas também por uma maior contenção salarial.

Teoricamente, a medida parece acertada. Porém, aplicar essa fórmula em toda a Zona Euro significa piorar o nível de vida dos países onde os salários médios são mais baixos, como é o caso de Portugal. Uma medida deste tipo só pode conduzir a mais conflitos sociais e, consequentemente, a menos produtividade, anulando-se assim o eventual efeito positivo de uma redução salarial.

O actual estado do sector têxtil e do vestuário é um exemplo das consequências nefastas resultantes da aposta na mão-de-obra barata. Assim que o comércio deste sector foi liberalizado, os produtos asiáticos invadiram o mercado europeu, deixando países como Portugal numa situação delicada. Dizer que o mercado será mais competitivo recorrendo ao corte nos custos unitários do trabalho é, a meu ver, um engano.

Curiosamente, o Grupo de Trabalho do Sector Têxtil na Assembleia da República esteve esta semana em visita à nossa região. Entre as propostas apresentadas pelos empresários e trabalhadores presentes na audição pública, saliente-se o consenso em torno da necessidade de accionar as cláusulas de salvaguarda às importações asiáticas. Pode ser uma ajuda, mas não chega para resolver os problemas do sector. A liberalização do mercado foi adiada outras vezes na expectativa de que as empresas se preparassem e a verdade é que não o fizeram.

É hoje evidente que Portugal não pode competir com os custos de mão-de-obra praticados nos países asiáticos e nos novos parceiros de Leste. Por isso, em lugar da contenção salarial referida por Trichet, a Europa deve procurar ganhos de produtividade apoiando as empresas na incorporação de mais tecnologia nos processos produtivos e na defesa da propriedade intelectual. Aliás, foi isso mesmo que os empresários e trabalhadores presentes na audiência pública disseram aos deputados do Grupo de Trabalho. Em paralelo, deve ser incentivada a aproximação entre universidades e empresas no sentido de se acrescentar valor aos produtos da fileira têxtil, quer através da inovação tecnológica, quer através do design.

O que é válido para este sector é igualmente aplicável nos restantes sectores da economia portuguesa pelo que, em lugar dos cortes cegos propostos por Trichet, a economia europeia deve repensar as suas políticas industriais.

Por: João Canavilhas

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