Assim, de repente, reparamos que os nossos autarcas foram eleitos há cerca de ano e meio. O que, não sendo muito tempo, para qualquer coisa que se veja, é tempo suficiente para já se ter visto qualquer coisa. Esclarecendo que não há forma de definir nenhuma destas “coisas”, como de intenções está o outro mundo cheio, ao ponto de no inferno já transbordarem as boas, sempre podemos concordar em nos focar nas decisões. Nessa categoria, o nosso autarca decidiu, por exemplo, candidatar o Teatro Municipal a uma subvenção da Direção das Artes para depois decidir não se sujeitar às exigências da aceitação da dita. O que, dependendo da perspectiva de cada um, tanto poderá ser interpretado por ausência de conhecimento sobre o funcionamento destas coisas, como por ausência de capacidade de compromisso com algo que não se domina nem se quer dominar. Neste pormenor ficou apenas a faltar a intenção de submeter qualquer das decisões, a da candidatura e a da desistência da dita, “a consulta pública” para podermos completar o padrão da atual forma de governo. Percebe-se, portanto, que o executivo camarário prefira enveredar por projectos a longo prazo. Prazo tão longo que nem será nada descabido pensar que não elegemos um autarca para nos resolver os problemas do dia-a-dia, mas um que estará empenhado em resolver os problemas dos nossos netos, se os chegarmos a ter. No entanto, quando as poucas decisões visíveis envolvem carros e a forma de estacionamento dos ditos, nem isso será muito certo. A sê-lo, fica por identificar que tipo de netos beneficiará disso, mas talvez quem ainda por cá andar, em 2040, consiga descobrir.
Enquanto sim e não, podemos contar com uma governação do município assente no chamado “empatanço”. Esse subterfúgio de recurso para quem só está interessado em que o tempo de mandato passe de modo a obter outro mandato e por aí fora. Bem podendo, neste caso, ser traduzido pela promessa de, qual salvador desta pátria e da outra, muito “democraticamente”, resolver as “grandes” questões, através da vontade popular expressa em sucessivas, infindáveis e infrutíferas consultas públicas, para justificar a irresolução das pequenas. Ou seja, para não se fazer nada, além de amimar os potenciais eleitores com inaugurações das novas pedras nas calçadas esburacadas nas ruas da cidade, protocolar umas parcerias (a maioria das quais completamente estéril) e distribuir uns cheques por tudo o que bula e tuja (animais) e para o que não mexa (árvores e proteções individuais para as tratar ou, para se ser mais preciso, destratar) e, eventualmente, não se ser responsabilizado por nada, porque quem muito faz, muito erra, e, só não erra, quem não faz. Percebe-se, então, toda a resistência à exposição pública de ações, com alguma eficácia e propósito governativo, que não envolvam festas (porventura o departamento camarário que mais e melhor funcionará), “prendas” e agrados peculiares à base eleitora, seduzida por um ideário de marçano, com ar de entendido, à procura das soluções perfeitas. Enquanto sim e não, mesmo não sendo tolos, sempre nos poderemos ir entretendo com as belas das festas e os bons dos bolos.
Enquanto sim e não
“Enquanto sim e não, mesmo não sendo tolos, sempre nos poderemos ir entretendo com as belas das festas e os bons dos bolos.”