Desde o início do ano que o Governo espanhol decidiu eliminar o IVA de alimentos considerados de primeira necessidade, como o pão, o leite, o queijo, os ovos, a fruta, os legumes e leguminosas, as batatas e os cereais. Já noutros alimentos, como o azeite e massa, reduziu de 10 para 5 por cento. As ajudas preveem ainda que se mantenha o congelamento do preço máximo das garrafas de gás, que seja prolongado o limite de 2 por cento nas atualizações anuais das rendas de casas e as suspensões de despejos de famílias vulneráveis.
O INTERIOR foi até Fuentes de Onõro, vila espanhola que faz fronteira com Vilar Formoso, para perceber se estas descidas atraíram mais portugueses para o comércio do país vizinho, mas os clientes que abordamos no principal supermercado da localidade consideram que não compensam. Maria Adelaide Gonçalves veio com o marido e os dois filhos do concelho de Pinhel na esperança de encontrar preços mais acessíveis com a redução do IVA e ficou desiludida. «Em Portugal é quase ao mesmo preço daqui», refere, apontando o exemplo dos produtos alimentares, que «são iguais ou até mais caros». Os produtos de higiene «ainda são os que são mais baratos, mas não muito», refere a pinhelense. Quanto ao combustível, Maria Adelaide Gonçalves não tem grande opinião: «Antes vínhamos cá e compensava, mas agora não sei. Vamos agora abastecer e ver se é vantajoso», despede-se.
Já Paulo Cruz, de Vilar Formoso, garante que só passa a fronteira para comprar aquilo que «não conseguimos em Portugal, aquilo que não existe lá», porque a redução do IVA não tem assim tanto impacto. «No final das contas, os preços desses produtos baixaram apenas um ou dois cêntimos» e não se «reflete na conta final», considerou em declarações a O INTERIOR. «Tudo isto é do Intermaché e aquele é de Espanha», aponta Fernando Lopes enquanto coloca alguns sacos de compras na mala do carro no parque de estacionamento do supermercado Carrefour, em Fuentes de Oñoro. «Os preços podem não ter subido, mas os que estavam caros continuam caros, mais caros do que no Intermaché de Vilar Formoso. Aqueles em que baixou o IVA são os produtos que não necessitamos todos os dias, que só compramos de vez em quando», adianta.
Um dos produtos que leva Fernando e Margarida Lopes ao país vizinho é a carne. «Pode não ser só pelo preço, mas também pela qualidade, principalmente a carne de vaca», sublinha o reformado natural do concelho de Almeida. O casal revela que regularmente passa a fronteira para fazer compras de supermercado, mas só no dia em que foram abordados por O INTERIOR é que olharam com «mais atenção» aos preços devido à redução do IVA. E a conclusão é que «certas coisas “não aquece nem arrefece”. Não notamos diferença, ao fim ao cabo não se nota muito», considera Margarida Lopes. Porém, o casal de reformados realça que em Espanha ainda se veem alguns produtos nacionais mais baratos do que em Portugal. «Uma botija de gás em Portugal custa não sei quanto e aqui são 17 euros. Não me pergunte quanto é lá porque não consumo o português, mas sei que cada botija custa mais 10 a 12 euros e da mesma marca», critica Fernando Lopes.
O que parece já não compensar tanto é o combustível, que até há pouco tempo levava centenas de portugueses ao lado de lá da fronteira. «Costumo abastecer no Intermaché de Vilar Formoso, onde é ainda mais barato do que em Fuentes. Em Espanha era mais barato quando o Governo subsidiava 20 cêntimos por litro, eles cortaram essa ajuda então agora está mais caro que em Vilar Formoso», assinala Fernando Lopes, para quem «o Governo devia aumentar tanto os salários e as reformas como sobe a inflação, eles deviam ser obrigados a fazer isso. Falam tanto no combate à pobreza e depois na prática não vemos nada».
Juan Luís Bravo, proprietário do Carrefour – Fuentes de Onõro, confirma que «não se nota maior afluência de clientes portugueses porque temos uma grande fidelização de clientes desde de sempre». Segundo o empresário espanhol, o que tem havido é uma mudança nos hábitos de consumo e na aquisição de produtos que “pesem menos na carteira”. «Todos os dias notamos o aumento de vendas na nossa marca. As pessoas não deixam de comprar certos produtos, o que fazem é, em vez de comprarem das principais marcas, compram a marca Carrefour», declara Juan Luís Bravo. Quanto ao IVA, o responsável lembra que essa redução comparativamente a Portugal já existia antes. «A maioria dos produtos de alimentação já tinham o IVA mais baixo do que em Portugal, por exemplo, o IVA do azeite e do óleo é de 23 no vosso país e cá é de 10 por cento. Por isso é que digo que não notamos grande aumento de clientes porque as pessoas já vinham cá para comprar estes produtos», acrescenta o responsável.
Os produtos de limpeza e de higiene pessoal são aqueles que aumentaram as vendas nos últimos tempos, «porque são mais baratos em Espanha do que em Portugal». Situado no município transfronteiriço de Fuentes de Oñoro, o Carrefour (antigo Gildo) tem 36 funcionários permanentes e mais 14 ao fim de semana. «Mais de metade dos nossos funcionários são portugueses», destaca Juan Luís Bravo, segundo o qual 65 por cento dos seus clientes são oriundos de Portugal, mas especificamente dos concelhos de Almeida, Pinhel, Sabugal, Figueira de Castelo Rodrigo e Guarda.
Carina Fernandes