«Todos temos um dragão dentro de nós que nos dá força e ambições»
P – O que inspirou este livro, “A Sombra do Dragão”?
R – Este livro foi inspirado após uma visita noturna ao burgo medieval da cidade e ter visto uma imagem talhada em ferro, no interior da Torre dos Ferreiros, servindo de iluminária ao recanto do Senhor dos Aflitos. Uma imagem intrigante, nunca tinha reparado nela. Era um dragão num dos baluartes defensivos mais significativos na cidade da Guarda. E surgiu a questão: o que estaria um dragão a fazer ali?
P – O título é intrigante: que dragão é este e o que significa? E qual é a relação com a Guarda?
R – Este dragão simboliza a insatisfação interior de cada um, o espírito do ser humano, uma guia e guarda com poder do fogo e proteção. A utopia dos dias e que nos faz ter força para sermos melhores. Todos temos um dragão dentro de nós que nos dá força e ambições. O dragão é simbólico, mas uma referência forte, remete para o desconhecido, para uma força oculta que aparece sempre que a curiosidade humana dele necessita. É, de certa forma, o sonho individual por concretizar, ou o caminho que temos de percorrer para alcançarmos os nossos objetivos. O dragão seria, pois, o espírito interior de cada um e do Reino, enquanto ele lá estivesse, cravado na silharia da Torre, a cidade e o país estariam a salvo, ou seja, a Guarda seria uma cidade guia. Estando ele num recanto religioso e numa torre pertencente ao sistema defensivo, quisemos associá-lo à importância que a cidade da Guarda teve desde sempre na defesa do reino português. Atualmente o brasão da GNR tem a imagem de um dragão simbolizando a defesa da “lei e da grei”. Era, pois, uma cidade predestinada a proteger o reino e com um “protetor”.
P – Foi escrito com Carlos de Bragança, como surgiu essa parceria?
R – Esta parceria foi essencial e interessante. Enquanto eu desenhava as personagens, dando-lhes vida narrativa, permitindo a sua transformação interior a partir dos espaços que percorriam; o Carlos conseguia descrever o poder que o sonho da Alquimia sempre teve no destino humano. O Homem, sempre insatisfeito e querendo mais, procurava a riqueza mundana esquecendo o valor do saber e da transformação interior. Ele conseguiu mostrar que a transformação interior se sobrepõe à transmutação da matéria e é essa a verdadeira mudança muitas vezes necessária ao Homem.
P – Na apresentação afirmou que o livro era «uma ode à Guarda». Quer explicar?
R – É uma ode pelo tema abordado. Não se encontra composta em verso, nem tão pouco em estrofes simétricas, como uma ode original, mas é laudatória e emotiva, foi um pretexto para narrar os meus sentimentos mais intimistas e sublimes, neste caso a exaltação de uma ocasião especial, na altura a inauguração da Torre. A cidade aparece glorificada ao longo da obra, tanto na viagem interior do protagonista, como na construção de uma obra grandiosa. É dedicada à cidade que, orgulhosamente edificada num morro de granito, sempre defendeu as fronteiras e se impôs na geopolítica nacional. Quisemos também mostrar a resiliência deste povo, da Guarda, que já na Idade Média lutava contra muitas adversidades: o clima, o isolamento, as parcas condições, mas tinha uma gente determinada e aguerrida.
P – A isso se deveu a apresentação na véspera do Dia da Cidade? Qual é a mensagem que os guardenses podem encontrar no livro?
R – Este livro já se encontra pronto há cerca de dois anos, quando a Torre dos Ferreiros foi intervencionada. Estava pronto na altura da inauguração, e pronto o seu lançamento, mas várias condicionantes (pandemia e confinamentos) arrastaram este projeto para 2022. Quisemos lançar o livro um dia antes do 823º aniversário da Guarda pelo tema, por se passar no casco urbano medieval da cidade, e o local de ação – Torre dos Ferreiros – significar um espaço revivalista e intimista para cada guardense. Alguns dos lugares são significativos e reais, ao lerem o livro poderão seguir os vários caminhos trilhados pela personagem principal.
P – Já tem novo livro em vista?
R – Há algumas ideias, mas pouco tempo para as concretizar. Quem sabe…
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ANABELA MATIAS
Idade: 48 anos
Naturalidade: Guarda
Profissão: Professora
Currículo: Licenciada em Línguas e Literaturas Clássicas e Portuguesas; Mestre em Língua, Cultura Portuguesa e Didática e Doutora em Letras; Tem seguido a linha de investigação da Literacia; da construção da personagem em Vergílio Ferreira; a associação da Literatura à Toponímia, a sua importância no tecido urbano e na evolução diacrónica da cidade; É autora do “Roteiro Vergiliano – A Guarda Escrita por Vergílio Ferreira” e coautora da “Cartografia Literária da Guarda”. É ainda autora do conto “A Torre, Os fantasmas cá da terra!” e coautora do conto “A Sombra do Dragão”.
Livro preferido: “Estrela Polar”, de Vergílio Ferreira
Filme preferido: “O Nome da Rosa”, de Jean-Jacques Annaud
Hobbies: Ler, escrever, cinema e cozinhar