Com o nascimento da ovelha Dolye, a clonagem ganhou uma nova dimensão, passando a ser alvo de um fortíssimo debate científico, tecnológico, social, económico e principalmente ético. Várias vozes “contra” a clonagem centraram a sua argumentação nos problemas éticos associados a esta nova tecnologia, ao passo que os “adeptos” da clonagem procuraram salientar os benefícios que daí resultariam para o ser humano, principalmente ao nível da saúde. Sob este prisma da saúde e com o objectivo de prolongar da vida, enquanto fenómeno físico, a comunidade científica tem recorrido ao mais variado conjunto de práticas científicas, entre as quais os xenotransplantes.
O xenotransplante é o nome pelo qual é conhecido o transplante de órgãos entre diferentes espécies. O conceito de espécie é definido como a capacidade que dois indivíduos têm em se reproduzir, dando origem a descendentes férteis. Por exemplo, um cão e um porco não podem acasalar e dar origem, com sucesso, a descendentes férteis. Deste modo, estes dos animais são de espécies diferentes.
No pólo oposto, temos transplantes de órgãos entre indivíduos da mesma espécie, apesar de geneticamente distintos, que são designados por alotransplante. Este é tipo de transplantes praticado pelo homem, envolvendo, principalmente, órgãos como rins, coração, medula óssea e fígado, Os alotransplantes têm tido enorme sucesso, contudo, o ritmo de procura têm excedido largamente a oferta, pelo que a comunidade científica procurou desenvolver tecnologias que pudessem colmatar esta escassez de recursos. As técnicas de engenharia de tecidos, onde células vivas são usadas para produzir órgãos e tecidos substitutos, são muito promissoras, mas encontram-se numa fase muito precoce de desenvolvimento. A pele pode hoje ser substituída por esses métodos, mas o desenvolvimento de válvulas de coração e de órgãos funcionais por bioengenharia, é algo muito longínquo. Desta forma, os xenotransplantes surgem como uma alternativa viável para os alotransplantes, todavia, estas técnicas trazem acopladas a si um conjunto de problemas, onde se destacam principalmente os éticos, clínicos e económicos.
Desde logo, neste tipo de tecnologias coloca-se a questão ética de saber até que ponto é legítimo ao homem utilizar animais em benefício próprio. Existe uma corrente que defende a não utilização de animais uma vez que qualquer animal, racional ou não, tem o direito de viver livre de dor, sofrimento e seguir o seu próprio interesse. Do outro lado, estão os defensores da utilização, uma vez que os seres humanos já matam animais para comer e usam as suas peles e outros produtos seu beneficio, pelo que esta nova utilização não traz novas implicações éticas.
Numa outra dimensão surgem os problemas clínicos, uma vez que os transplantes podem ser rejeitados pelos organismos onde são implementados. O homem tem anticorpos “próprios” que circulam no sangue, estes quando detectam a presença de corpos estranhos desencadeiam reacções no sentido de os eliminar, esta tem sido a grande causa de insucesso dos xenotransplantes. Outro problema clínico dos xenotransplantes é a possibilidade de aparecimento no ser humano de doenças de origem animal. Esta possibilidade de transmitir vírus letais convenceu muitos investigadores a abandonar o transplante de órgãos de primatas para humanos. A comunidade científica acredita que o vírus do HIV teve origem nos símios, tendo sido transmitido à população humana.
Associados a estes dois factores surge um terceiro problema – os custos destas tecnologias. Estes custos não se centram só no desenvolvimento desta tecnologia, mas também na sua implementação ou no posterior acompanhamento dos diferentes casos clínicos.
Apesar de, em termo teóricos, ser uma tecnologia promissora a sua implemantação requer ainda um grande debate prévio, no sentido de construir um consenso alargado dentro da sociedade.