A Feira de S. João

Escrito por Francisco Manso

“Os privilégios atribuídos pelo rei a todos aqueles que quisessem deslocar-se à Guarda por ocasião da feira eram impressionantes. Eram medidas de discriminação positiva, diríamos hoje.”

A Feira de São João, na Guarda, constituiu, pela sua relevância, um marco no desenvolvimento comercial, cultural e social da região. Foi criada por D. Afonso III em 25 de março de 1255, na então jovem cidade da Guarda, sendo uma das mais antigas no país.
Surpreendentemente, uma feira ainda um pouco mais antiga que a da Guarda era a que se realizava em Vila Mendo, hoje uma simples anexa de Vila Fernando.
Os privilégios atribuídos pelo rei a todos aqueles que quisessem deslocar-se à Guarda por ocasião da feira eram impressionantes. Eram medidas de discriminação positiva, diríamos hoje.
Todos podiam vir em segurança, pois sabiam que estavam isentos de penhora por qualquer tipo de dívida, a não ser que se provasse que teria que ser paga no decorrer da própria feira. Embora a feira durasse quinze dias, como as pessoas tinham que se deslocar de longe, as regalias prolongavam-se por trinta dias.
Quando o comboio chegou à Guarda, realizavam-se serviços especiais, a preços reduzidos, desde Abrantes e Figueira da Foz.
A feira era um marco na vida de todos, que para esta altura guardavam os grandes acontecimentos do ano. As datas de pagamento dos impostos chegavam a ser calculadas em função da feira. Era um ponto de encontro de pessoas e de ideias. Aqui tinham contacto com as primeiras novidades e acontecimentos.

O Largo da Feira

O local onde se realizava a feira foi mudando ao longo dos anos, ajustando-se a novas necessidades e a melhores condições higiénicas e sanitárias. Do Largo de S. Vicente, então muito maior e a igreja uma simples capelinha, teria passado para junto da igreja da Sr.ª da Vitória, sugestivamente chamada de Sr.ª do Mercado. Mais tarde passou para a praça, hoje de Luís de Camões, e vulgarmente Praça Velha, para se distinguir da Nova, entretanto aberta.
Claro que estes locais eram destinados ao mercado semanal, mas nos dias de feira anual havia complementaridade de espaços, e a feira estendia-se à sua volta.
Já no século XX passou pelo Largo Serpa Pinto, pelo Largo da Boavista, pelas Lameirinhas e a Mata, e pela Avenida dos Bombeiros Voluntários.

1. Feira No Largo Da Boavista

1. Feira No Largo Da Boavista

 

A Feira do Gado

A Feira do Gado tinha lugares próprios, como é compreensível.
Havia o Campo dos Bois, onde hoje se encontra a Santa Casa da Misericórdia, o Largo da Boavista e o Mercado dos Porcos, no local onde mais tarde se instalou a Delegação de Saúde e a serração de Gouveia e Cruz. Passou, depois, para os terrenos entre a capela do Sr. do Bonfim e os muros do quartel do R. I. 12.
Ainda esteve, por fim, no largo por baixo do Hotel de Turismo, à volta da antena da Emissora Nacional, e na encosta do Torreão?

2. Feira Do Gado, Junto Ao Moinho Do Vento

2. Feira Do Gado, Junto Ao Moinho Do Vento

Feira e Festa

A pé, a cavalo ou montados num jerico, os feirantes, feitos romeiros, despovoavam as aldeias.
Feitos os negócios era a vez do divertimento, porque feira e festa quase se confundiam. Por aqui podiam apreciar as melhores companhias de teatro (chegou a haver duas na mesma feira), o circo, os cavalinhos e as bandas de música. Havia, é claro, as touradas, pois sem elas a festa não seria festa.
O cinema era outro espetáculo muito do agrado. Foi pelo S. João de 1909, numa barraca instalada no Campo da Boa Vista, que pela primeira vez foi visto e apreciado pelas gentes serranas.

Primeiras feiras em Portugal

3. Cartaz Da Feira De

3. Cartaz Da Feira De

1205 – Vila Nova de Famalicão

1229 – Vila Mendo
1255 – Guarda

1258 – Guimarães
1260 – Covilhã
1261 – Beja
1262 – Penamacor
1272 – Vila Real1272 – Bragança
1273 – Trancoso
1275 – Évora
1281 – Castelo Mendo
1284/5- Leiria
1286 – Marialva
1286 – Viana do Castelo
1287 – Celorico da Beira
1296 – Sabugal, talvez anterior.
1308 – Aguiar da Beira
1373 – Castelo Rodrigo

 

 

 

* Investigador da história local e regional

Sobre o autor

Francisco Manso

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