Sociedade

O hospital vai a casa dos utentes na Guarda

Img 1048
Escrito por Efigénia Marques

Objetivo da Unidade de Hospitalização Domiciliária é garantir o internamento no conforto de casa do doente com a prestação de cuidados idênticos ao internamento convencional

A equipa de Hospitalização Domiciliária da Unidade Local de Saúde (ULS) da Guarda está na estrada há pouco mais de um ano. Já cuidaram de 115 doentes e percorreram 25.660 quilómetros em visitas diárias para evitar a deslocação dos utentes ao hospital. O INTERIOR e a Rádio Altitude acompanharam estes profissionais numa das suas missões.
Diariamente, pelas 9 horas, a equipa composta por médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos e farmacêuticos reúne em frente à zona da consulta externa do Hospital Sousa Martins. Pouco depois, munidos do material necessário, fazem-se à estrada em direção à casa do primeiro utente, no Bairro do Pinheiro, na cidade. Com a bata descartável vestida e mochila às costas, apenas alguns passos separam os profissionais de saúde de Salomé Silva, a primeira paciente do dia. «Olá, Salomé. Está boazinha?», ouve-se ao entrar no apartamento. Assim que atravessa a sala, a médica Paula Neves é a primeira a elogiar «as flores muito bonitas» que estão em cima da mesa. Para espanto dos visitantes, a dona Salomé alegra-se e explica que as flores são do seu jardim.
Sem a equipa da ULS da Guarda, Salomé Silva teria de ficar internada no hospital, por isso este serviço é «uma maravilha» já que permite receber em casa todos os tratamentos necessários. Além disso, a guardense agradece também a companhia destes profissionais, que «já são da família», confessa. Para a filha Margarida Silva, este é um «serviço de excelência focado no utente», considerando que a Hospitalização Domiciliária é uma «mais-valia», uma vez que a sua mãe «pode estar em casa com a família» e, mesmo assim, receber os cuidados necessários. Cerca de meia hora já passada, o relógio não para e o dever chama pela equipa, que se faz ao caminho para visitar o próximo doente. Mas antes, Salomé Silva tem uma dúvida: «E se isto [garrafa de soro] apitar, o que faço?», pergunta. «Telefona-nos. Se sentir algo diferente telefona logo!», responde a enfermeira Liliana Pereira.
O destino é agora o Prado, localidade situada às portas da Guarda. Esta é a segunda paragem da manhã. Médica e enfermeiras são recebidas afetuosamente pelo cão Oliver e pelo casal José Ventura e a mulher Josefina. «Demorámos um pouco, achou que já não vínhamos hoje?», pergunta Paula Neves ao senhor Ventura – como gosta de ser chamado. Os horários não são fixos. Os utentes da Unidade de Hospitalização Domiciliária gozam da companhia de toda a equipa pelo máximo tempo possível e dividir o tempo de uma manhã por todos não é tarefa fácil, mas estes profissionais fazem os esforços possíveis. «Este projeto é das melhores coisas que pode existir para um doente que tenha condições para aderir ao serviço», afiança o senhor Ventura, para quem a equipa não podia ser melhor. «Além de grandes profissionais, entre a equipa de saúde e as famílias dos utentes há uma grande amizade», garante. A esposa concorda que «é uma sorte ter acesso a este serviço», uma vez que, se assim não fosse, o senhor Ventura teria de «recorrer a um centro de reabilitação», adianta Josefina Ventura.
Mas não é apenas a equipa que marca os utentes e as suas famílias. O contrário também acontece. Marta Morgado, uma das enfermeiras, sente que «é bom estar com os utentes». No conforto do lar, os doentes estão «mais recetivos» aos ensinamentos dos profissionais e veem o seu trabalho como «uma mais-valia». «Sentimos que já fazemos parte do núcleo da vida destas pessoas», acredita. O tratamento do senhor Ventura exige alguma dedicação – tanto por parte dos profissionais, como do próprio. É ajudado pela equipa a caminhar, ainda que com algumas dificuldades. Quando a visita termina é Josefina Ventura que pergunta quando voltam. «A nós vê-nos amanhã. Esta tarde vêm os nossos colegas», respondem.
A viagem até à próxima Hospitalização Domiciliária é mais comprida. Seguimos até à zona do Instituto Politécnico ao encontro de mais um utente e nem a aproximação da hora de almoço para a equipa. «Vocês falam espanhol?», pergunta Paula Neves à restante equipa assim que chega à última casa. «Tanta gente, hoje!», exclama Angelina, esposa do utente que será tratado pela equipa da ULS. «Boa tarde, Andrés! Como está hoje?», ouve-se da enfermeira Liliana Pereira. Neste casal espanhol, o marido é mais reservado, ao contrário da sua esposa, e a comunicação entre os profissionais e a família é um pouco conturbada – mas eficaz. Os tratamentos necessários para este utente são mais delicados.
«Fique aqui sentadinho, não se levante», pede Paula Neves ao utente antes da equipa se despedir da família. Neste momento final é Angelina quem vai buscar um álbum de fotografias com o objetivo de mostrar imagens da sua juventude. Neste momento de confraternização a equipa reúne-se ao redor da esposa de Andrés para todos verem e comentarem o que vão vendo. Mas é hora de seguir viagem e, feitas as despedidas, a boa disposição acompanha a equipa até a carrinha da ULS. O calor é imenso e o relógio marca 14 horas. Entre fardas, material hospitalar, temperaturas altas, alguma fome e muito cansaço, a boa disposição é coisa que não falta a quem anda de porta em porta a tratar doentes como se fosse no hospital.

Equipa disponível 24 horas por dia

É já depois da hora de almoço que a equipa da Hospitalização Domiciliária chega às instalações do Sousa Martins. Orgulhosas do serviço prestado, passam o testemunho a quem as vai render durante a tarde. No dia seguinte tudo se repete, com histórias diferentes, mas com a mesma vontade de sempre de ajudar a melhorar o dia-a-dia destes pacientes.
Segundo João Correia, diretor de serviço da ULS da Guarda, este projeto começou a ser pensado em 2019 e apenas saltou para a estrada em 2021. O surgimento da pandemia «atrasou o início do projeto», mas nunca o colocou na gaveta do esquecimento. Os utentes estão nas suas casas, ou em casas de familiares, e «têm de garantir as condições mínimas definidas» para que possam usufruir deste serviço de saúde. O coordenador da equipa explica que «a única coisa que o utente não tem em casa é um serviço de urgência ou um serviço de permanência do médico». De acordo com a ULS, a Unidade de Hospitalização Domiciliária (UHD) prestou cuidados a 115 doentes no seu primeiro ano de atividade, dos quais 110 já tiveram alta. Conta com uma equipa médica e de enfermagem disponível 24 horas por dia e está acessível a doentes cujo domicílio se situe, preferencialmente, no raio de 8 quilómetros em relação ao Hospital Sousa Martins para «garantir segurança e rápido tempo de resposta», refere a ULS, adiantando que o objetivo deste serviço é garantir «o internamento no conforto de casa do doente, com prestação de cuidados, rigor e segurança clínica idênticos ao internamento convencional».

Img 1085

Sobre o autor

Efigénia Marques

Leave a Reply