Entrevista Sociedade

O 25 de Abril na perspetiva de várias gerações

Whatsapp Image 2022 04 28 At 11.57.27
Escrito por Efigénia Marques

Cinco pessoas de idades diferentes contam como viveram, que recordações têm e o que sabem do 25 de Abril de 1974, mas falam também do que ficou por cumprir nestes 48 anos

Passaram 48 anos daquele que foi um dos acontecimentos mais importantes para a história portuguesa. Foi a propósito da Revolução dos Cravos e do fim da ditadura que O INTERIOR falou com várias gerações para perceber a visão de cada uma delas sobre o antes 25 de abril, o dia da revolução e o que mudou entretanto.

«Lembro-me que andava a trabalhar e levei o rádio para o campo»

Pouco se lembra desse dia, uma vez que nos Chãos, aldeia do concelho da Guarda onde ainda reside, a revolução não se viveu com a mesma intensidade que nos grandes centros urbanos ou na capital. Mas, tal como a maioria dos portugueses nessa época, também Aida de Almeida soube da revolução através da rádio. «Lembro-me que andava a trabalhar e levei o rádio para o campo» para acompanhar a situação.

Aida de Almeida, 1925

«Normalmente não o levava, mas nesse dia levei», revela, acrescentado que na altura foi semear «uma leira» de batatas. Aida de Almeida, que a 25 de abril de 1974 tinha 49 anos, destaca principalmente as diferenças na sociedade, dizendo que atualmente «já não há amizades, só invejas, não há vergonha, não há respeito». Considera que existiu liberdade «a mais», pois «agora não há respeito nenhum do homem para a mulher, nem para ninguém». Porém, considera que houve muitas coisas boas, como, por exemplo, na educação. «Os jovens agora são uns senhores, vão para as universidades… Nós não! Chegava a quarta classe e parávamos. Quem é que ia para a Guarda estudar, nem os mais ricos! Não havia camionetas, não havia transportes. Só fazíamos a quarta classe e não era todos, nós éramos seis irmãos, todos sabiam ler, e só eu é que a fiz», exemplifica a antiga doméstica.

 

«Conseguimos fazer uma revolução inédita»

Rosa Azevedo é natural da Guarda e nasceu precisamente dois meses após a revolução. Ou seja, toda a sua adolescência foi vivida no pós 25 de Abril.

«Nunca vivi privada da liberdade, para mim foi uma juventude normal, dentro dos parâmetros normais, com todas as benesses que me foram dadas com o 25 de Abril, como o direito à educação, à minha expressão, a movimentar-me para onde quisesse e a falar com quem quisesse», destaca. Sabe do que fala, pois tem uma «boa perceção» do que era o Estado Novo por ter tido um maior contacto com as gerações que viveram sob a ditadura. «As pessoas tinham obrigações, mas não tinham direitos. Eram forçadas a calarem-se e não tinham opinião própria, não se podia dizer muita coisa, não se podia escrever como hoje, vocês, jornalistas escrevem. E as mulheres, principalmente, não tinham voto na matéria», refere a guardense.

Rosa 02

Rosa Azevedo, 1974

Por isso, considera que uma das maiores diferenças foi para as mulheres, «que tinham um papel muito diminuído na sociedade e a partir do 25 de Abril puderam exprimir-se e ter outras incumbências, como trabalhar fora e poderem até denunciar atos de violência doméstica que, até então, eram consideradas coisas normais». A educação e a saúde foram outras áreas beneficiadas com a Revolução dos Cravos: «Não havia Serviço Nacional de Saúde, que foi criado depois. O acesso ao ensino foi dado às pessoas de forma natural», recorda Rosa Azevedo. «Ao fim ao cabo as pessoas rebelaram-se contra o Estado da altura e conseguimos fazer uma revolução inédita, com cravos, que é coisa que já não se faz hoje, infelizmente», vinca.

 

«Associo sempre o 25 de Abril à “Grândola, Vila Morena”»

«Eu associo sempre o 25 de Abril à “Grândola, Vila Morena”, é a música que passava todo o dia na rádio e os meus pais gostavam imenso. Sentiam mesmo aquilo porque eles viveram no tempo da ditadura», começa por dizer Patrícia Lourenço, natural de Figueira de Castelo Rodrigo.
A professora de 38 anos considera que, hoje em dia, a maioria dos jovens «não valoriza» esse feito porque «não passaram pela ditadura, não sabem o que é viver sem ser livre, sem ter opinião.

Patricia 2

Patrícia Lourenço, 1984

Hoje, qualquer um é livre de se expressar, mas sempre tendo atenção que a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros». E com isto Patrícia Lourenço quer dizer que, «enquanto crianças, a liberdade não é condicionada, mas enquanto adultos é», principalmente em meios pequenos, onde «toda a gente se conhece e acaba por haver influências por este ser amigo daquele e para não se causar suscetibilidades», acrescenta.

Porém, a docente constata que a revolução trouxe «muitas coisas boas» para as mulheres. «Primeiro foi nós votarmos e termos os mesmos direitos que os homens. Depois, foi a questão do acesso à educação, onde as escolas passaram a ser mistas. Eu lembro-me perfeitamente do meu pai dizer que as meninas tinham de ir por um lado na escola e os rapazes por outro», exemplifica Patrícia Lourenço.

«Costuma-se dizer que o 25 de Abril foi muito bom, o 26 é que poderia ter sido melhor»

Miguel Bandarra, trabalhador-estudante de Desporto, também afirma que o 25 de Abril de 1974 foi «um dia marcante para voltarmos a ter a liberdade».
«As pessoas estavam privadas de muitas coisas, não podiam dizer tudo o que queriam, havia censura e a PIDE. Não se podia dizer nada contra o regime, muito menos contra Salazar e havia um partido único», elenca o jovem, para quem «o povo em si não soube dar valor ao próprio dia». Uma opinião que justifica dizendo que «as pessoas cometem algumas incongruências e atos que também estão a ir contra a sua liberdade. Eu costumo dizer que tem de haver liberdade e responsabilidade, mas muita gente não tem essa responsabilidade e por isso não podem ter a liberdade que querem e que desejam».

Miguel Bandarra

Miguel Bandarra, 1994

Nesse sentido, o jovem guardense lembra que se costuma dizer «que o 25 de Abril foi muito bom, o 26 é que poderia ter sido melhor».
Quanto aos jovens de hoje em dia, Miguel Bandarra defende que os próprios não dão o devido valor à revolução «não só por culpa deles, mas pela própria sociedade e pelo sistema, a começar mesmo pelo ensino». Por isso, apela a que se faça «algo» para que o 25 de Abril não caia no esquecimento, porque «tem cada vez menos simbolismo para os jovens» e «se nada for feito, as gerações futuras poderão perder o verdadeiro significado daquilo que foi», conclui.

 

«Sei das coisas por aquilo que ensinam na escola e do que vou lendo nos jornais»

A noção que Daniela Moreira tem do 25 de Abril é semelhante à das gerações anteriores, mas com uma pequena diferença: a forma como adquiriu essa informação. «Sei das coisas por aquilo que ensinam na escola e pelo que vou lendo em jornais e vendo em vídeos», adianta.
«Atualmente já existe bastante essa diferença. Enquanto que os meus pais ainda souberam de histórias através do ‘passa-palavra’, acho que as pessoas de agora procuram saber mais informação.

Daniela

Daniela Moreira, 2004

Por exemplo, numa aula em que é debatido o tema, quem ficar com interesse vai procurar mais, seja em jornais ou no Youtube», garante a estudante. Quanto à importância dada pelos jovens à data, a jovem natural da Mêda defende que eles «sabem o que é, até pela relevância que a própria sociedade dá ao momento», mas desconfia que lhe deem o devido valor. «Podemos verificar isso no direito ao voto. As pessoas têm esse direito, pelo qual foi preciso lutar bastante e foi graças ao 25 de Abril que foi conquistado também, mas as pessoas não o exercem. Eu acho que se têm esse direito deveriam votar», defende a estudante de Comunicação.

 

 

Carina Fernandes

Sobre o autor

Efigénia Marques

Leave a Reply