Quando da divulgação do elenco deste Governo, há meses, li na imprensa, que a Ministra da Educação era um grande nome da Sociologia. Numa obra que ficou conhecida (Como se escreve a História, Edições 70, para Portugal), Paul Veyne, do Colégio de França, declarou a dada altura: “A Sociologia é História e retórica”.
Ainda não vi melhor definição e corroboro-o com total facilidade, precisamente com Georges Gurvitch, numa obra com décadas, ainda mais famosa do que a primeira. Trata-se de As Classes Sociais, que as Iniciativas Editoriais publicaram em Portugal em X – 1970. (Repare-se que tanto Veyne como Gurvitch são gauleses; e o último é sociólogo).
Atendo-me apenas a teóricos não-marxistas, noto que o conceito de classe varia de autor para autor, de Schmoller a Pareto, de Max Weber a Schumpeter, v.g.. O próprio Gurvitch é claro: “a importância capital das classes sociais – cujo número, caracteres, relações respectivas, papel histórico efectivo não pode ser previsto nem determinado a priori – é função dos tipos particulares de estruturas sociais globais e por vezes até de conjunturas específicas”. Desde do primeiro momento, os meus alunos ficam proibidos de usar a palavra “classe”– excepto se falarem de uma máquina germânica…
Quanto à Retórica, já Aristóteles falou em três géneros: epidíctico, judicial e deliberativo.
Se nem a História pode ser um critério de acção, tão – só porque se “move” no puro domínio do imanente – ou quase no puro –, então a Sociologia não tem nenhuma importância fundamentadora.
Claro que não se pode esperar de um jornalista a estatura de um grande sábio – com todo o devido respeito, claro. Mas também não pode esperar-se que um leitor minimamente atento aceite tudo o que em letra de imprensa vem.
É que a Educação só pode remeter para a espiritualidade, para o esforço. Quando os gregos propunham o resultado pelo esforço, o agonismo, estavam absolutamente certos. “Chibinha beca! Quem quer rama trepa”.
Sucede é que o esforço é doloroso. Hesíodo, grego, talvez de finais do séc. VIII a.C.: “Mas ante o mérito, puseram os deuses o suor; longo e escarpado é o caminho que conduz até lá, e áspero a princípio; mas, depois de chegar ao cimo, em fácil se volve, por difícil que seja”.
Acontece é que os governantes deste nosso País se estão absolutamente nas tintas para a Grécia.
Não desapareceu o Grego dos liceus?
Mais. O P”S” é uma das mais catastróficas mistificações deste nosso Portugal. O P”S” tem uma imagem de marca, que aliás lhe vem da sua originária matriz – é laico, é secular. Ora, não é preciso ser-se religioso para se concluir – masoquismo à parte – que o sofrimento é uma benção de Deus. E que, mais tarde ou mais cedo, o gozo sem freio há-de passar a factura.
Até os EEUU já chegaram a tal conclusão. Há 25 anos, bem no coração do Texas, pude ficar boquiaberto com duas freiras num Porsche, a alta velocidade e rindo transbordantes de gozo, como pude ficar emocionado com a preocupação da Verdade por parte de…. milionários com avião próprio.
Não se lobriga à grandeza do sofrimento, tal como não se lobriga que se continue a matar a Natureza – a auto-destruirmo-nos – envenenado-a.
O que a sociedade laica quer fazer ao sofrimento é eliminá-lo – para o que conta com a prestimosa colaboração dos laboratórios que produzem fármacos e da piramidal preparação humanística conferida nas faculdades em que a Medicina é assimilada a técnica….
Só que esta encarniçada luta contra o sofrimento não só não funciona como tem um resultado: sai-lhe o tiro pela culatra.
Os alunos passarão custe o que custar. Porque o bode expiatório existe – os professores.
A Ministra da Educação já provou várias coisas a Portugal: que não percebe nada de Educação; que não identifica o País; que não tem educação própria; que não sabe rigorosamente nada – ou quase nada – sobre os professores; que não tem um espelho em casa frente ao qual a sua perspicácia possa concluir através do seu rosto; que, no fundo, é fascista. (Fascismo: irracional emergente).
Em três décadas de trabalho faltei – tão-só – por nojo ou qualquer lapso, e já me sucedeu n vezes, em viagens de estudo, v.g., trabalhar 20 e tal horas seguidas. Já me sucedeu custear do meu bolso, parcialmente, uma viagem de estudo a Madrid; e os meus alunos têm prometida uma viagem grátis se uma conta calada me sair no Totoloto ou Lotaria. (Ao leitor as minhas desculpas por estar a falar de mim).
Que formação humana dão as universidades Senhora Ministra? São, v.g., essa provinciana e triste Lisboa, ou essa provinciana e pequena Coimbra que perdurarão como paradigma de exaltação para os que saem das suas universidades, Senhora Ministra? E que treta é essa da “avaliação para a repetência”? Não sabe Vª Exª que um tão complexo problema postula o recurso a acções e entidades que não apenas os liceus e conselhos pedagógicos? Tenho que quedar-me.
Aceite todo o meu denodado apoio para a sua renúncia, Exª Senhora.
Guarda 19 – XI – 05
Por: J. A. Alves Ambrósio