O Governo reuniu, na semana passada, com os autarcas dos concelhos onde a pesquisa e prospeção de lítio vai avançar. Recorde-se que das oito zonas que estavam sob avaliação ambiental, seis delas receberam “luz verde”, sendo que há nove concelhos do distrito da Guarda abrangidos.
Segundo o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, estas reuniões serviram para «explicar aquilo que é a relevância do lítio, os ganhos económicos que podem resultar da sua exploração, os impactos ambientais que podem provocar e a forma de serem minimizados», assim como o facto da exploração do lítio em Portugal ter «mesmo regras ambientais, que resultarão do concurso a ser lançado e que resultam já da lei em vigor, que farão com que, com todo o respeito, não faça sentido comparar uma futura mina de lítio com minas feitas em Portugal há 70, 80 anos». Em conferência de imprensa realizada após a reunião com os autarcas, o governante explicou que antes da exploração mineira avançar decorrerá um processo «para averiguar se estas seis áreas contêm lítio com concentração suficiente para merecer uma exploração».
Já em relação ao que os municípios podem lucrar, a nível económico, com as minas, o ministro afirmou que «o rendimento das minas será partilhado com as autarquias», estimando que essa componente possa ser «da ordem de uma centena de milhares de euros por ano». Matos Fernandes escusou-se a providência cautelar anunciada pela Câmara de Pinhel. Entretanto, e depois da reunião com o ministro, alguns dos autarcas afetados pela exploração explicaram a O INTERIOR, as conclusões que tiraram deste encontro.
Câmara da Guarda quer acompanhar processo de prospeção
Depois de reunião com Matos Fernandes, o presidente da Câmara da Guarda, Sérgio Costa, disse ter havido uma «pequena evolução, que há uma predisposição por parte do ministro e do Ministério para dialogar com os municípios».
«O que nos foi referido é que esta pesquisa e prospeção será feita com métodos não invasivos, mas mesmo assim nós queremos continuar a acompanhar todo esse processo», acrescentou o autarca guardense, que continua preocupado com o processo. Por isso mesmo, Sérgio Costa adiantou que os municípios «exigiram acompanhar tudo isto, deve ser um processo absolutamente participativo, com os autarcas das Câmaras, das Juntas de Freguesia e com toda a população. Estas coisas não podem ser feitas nas costas de ninguém. Aquilo que disse ao senhor ministro foi que estava desgostoso por ter sabido de tudo isto pela comunicação social. É tudo ao contrário. Os autarcas deviam ter sido informados em primeiro lugar sobre esta matéria». Na sua opinião, «se as salvaguardas de certas condições não forem asseguradas, nós somos contra a prospeção de lítio. Agora se tudo isto for assegurado e for transformado numa mais-valia para o território, então aí estamos dispostos a tentar».
Município de Pinhel preocupado com destino do concelho
Rui Ventura, presidente da Câmara de Pinhel, admitiu não ter saído totalmente esclarecido da reunião com o ministro: «Explicaram aquilo que é a lógica da exploração do lítio, mas as preocupações com que entrámos foram as mesmas com que saímos. Ou seja, não está garantido, na minha perspetiva, aquilo que é a continuação do bem-estar ambiental no concelho de Pinhel, da sua agricultura, o que nos preocupa muito».
Para o autarca, há também «um conjunto de coisas que não estão garantidas, por exemplo, a criação de postos de trabalho com a exploração mineira. Dá a sensação que somos a África em Portugal». Rui Ventura considerou também que «a bateria de um telemóvel não é mais importante que o destino do meu concelho e deste território», porque «trabalhámos muito para a promoção deste território e vamos continuar a fazê-lo, portanto não podemos baixar os braços, tem de haver uma garantia e esta garantia os autarcas têm o direito de a pedir».
O edil pinhelense acrescentou que os autarcas não são contra a exploração do lítio e têm «a noção» da sua importância. No entanto, «a única coisa que queremos é fazer aquilo que as pessoas nos deram nas últimas autárquicas, que foi estarmos atentos ao que se passa no nosso território». De resto, Rui Ventura disse ainda ter ficado com a ideia de que, para o ministro, «é mais importante o lítio do que propriamente as pessoas».
Autarquia do Sabugal quer ser ouvida em todo o processo
O presidente da Câmara do Sabugal, Vítor Proença, confirmou não ter ficado satisfeito com o encontro e «transmitimos essa nossa indignação ao senhor ministro, no entanto, não nos foi adiantado mais nada em termos de contrapartidas, a não ser aquelas que estão descritas na lei».
O edil raiano recordou que a «grande preocupação» é sobretudo com as populações, pois, «como foi referido nessa reunião, continuamos com muito pouca informação relativamente a este processo, penso que devia ter sido mais divulgado, mais claro, e devia ter havido essa sensibilização junto das populações». Vítor Proença também defende que os municípios devem ser chamados para o processo e ser ouvidos: «Podia ter havido outra atitude, embora os municípios já tenham sido chamados a pronunciar-se em 2019, quando se iniciou este processo, mas agora era importante, uma vez que esta fase é mais avançada e já está de facto no terreno. São matérias muito sensíveis, nomeadamente para o nosso território, que já tem alguma atividade mineira e graves problemas ambientais por causa de minas a céu aberto e outro tipo de situações, que não queremos ver repetidas nos nossos territórios», alertou o autarca.
CIMBSE reclama criação de fileira associação ao lítio
A Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela (CIMBSE) também já tomou uma posição relativamente a este assunto no último Conselho Intermunicipal, realizado na semana passada.
Em comunicado enviado a O INTERIOR, a CIMBSE manifestou o seu «total desagrado quanto à definição do modelo e da forma» como está a ser conduzido o processo de prospeção e exploração de lítio na Comunidade Intermunicipal. Critica também «a falta de diálogo, concertação estratégica e não auscultação do poder local» por parte do Ministério do Ambiente e manifesta a sua «total estranheza» quanto «ao tempo e modo» em que o processo está a ser conduzido. A CIMBSE, presidida por Luís Tadeu, lamenta ainda que nalguns concelhos da região «a área abrangida representa perto de 40 por cento da área total do concelho». Daí que a localização da área de prospeção e exploração de lítio no território da CIMBSE deva ser «equacionada conjuntamente com o poder local, no sentido de minimizar o impacto ambiental, económico, turístico e social para o território, bem como, definir as regras e modelos de atuação em sede de eventual operacionalização».
A Comunidade está ainda desagradada com «a indefinição e ambiguidade» da aplicabilidade dos pareceres legais emitidos pelas Câmaras Municipais, considerando que se tornaram «consultivos e não vinculativos» quanto à prospeção e exploração de lítio. A concluir, a CIMBSE defende que a criação de uma “fileira” desta atividade no território, por forma «a gerar valor em toda a cadeia de exploração e transformação do lítio, com reflexo na economia local e regional». E avisa que pugnará pela «defesa intransigente dos legítimos interesses» das populações locais, agindo, «em termos jurídicos e técnicos, para alcançar um resultado que respeite os direitos e interesses» dos seus habitantes.