Rita Cruz nasceu no Hospital de Viseu, mas desde logo veio viver para a Guarda, sendo que se assume como uma “guardense de gema”. Cresceu na cidade mais alta e aqui ficou até aos 17 anos, quando concluiu o secundário. «Tenho imensas memórias, por isso a Guarda continua a ser um sítio muito especial para mim. Já não vivo cá há muito tempo, mas tenho sempre uma relação muito próxima, venho cá todos os anos», afirma.
Saiu de casa para estudar na Universidade do Minho, em Braga, onde se formou em Relações Internacionais, e depois ainda tirou uma especialização em Lisboa. Saiu pela primeira vez de Portugal para tirar o mestrado em Inglaterra e nunca mais parou. Podemos mesmo dizer que Rita Cruz já andou pelos quatro cantos do mundo. «Formei-me em Relações Internacionais e trabalhei na área dos diretos humanos e da ajuda humanitária até aos 30 anos e nessa altura fiquei muito desiludida com o mundo da ajuda humanitária, não com os direitos humanos, e decidi que o meu pão não podia ser ganho através da desgraça dos outros», sublinha a voluntária, acrescentando que respeita «muito o trabalho voluntário, não respeito é o trabalho pago na ajuda humanitária».
Por isso, Rita Cruz voltou a Portugal para tirar fisioterapia. «Eis que acabo o curso e o primeiro emprego que me é proposto é ir para Moçambique, então lá fui para Maputo», recorda. A partir daqui nunca mais parou e depois de Moçambique foi viver para a Austrália e agora reside em Kuala Lumpur, na Malásia. No entanto, antes de se fixar num sítio percorreu os cinco continentes através do voluntariado. «Comecei numa organização que ainda existe, a “Peace Brigades International”, na Colômbia, onde acompanhávamos defensores de direitos humanos que recebiam ameaças de morte. Quando eles saíam para trabalhar nós estávamos lá à porta, saíamos com eles até ao trabalho, quando acabavam vínhamos com eles, para aumentar o custo político destes assassinatos», relata. Esta é uma organização que existe há mais de 30 anos e «a verdade é que só houve um defensor de direitos humanos acompanhado pela organização que desapareceu, por isso é efetivo o que se faz», garante.
Depois da Colômbia rumou ao Sri Lanka, com a “Nonviolent Peaceforce”, e posteriormente fez outros voluntariados «mais pequeninos». Esteve no Afeganistão, com os Médicos do Mundo, «creio que em 2002», voltou ao Sri Lanka depois do tsunami de 2004. Entre as histórias mais marcantes que viveu nestas andanças, Rita Cruz destaca a que viveu na Colômbia. «Vivia numa comunidade de paz e houve uma vez em que os paramilitares invadiram o espaço e faziam imensas atrocidades, as armas, nunca tinha enfrentado uma coisa assim, terá sido talvez o momento mais marcante», recorda.
Rita Cruz, assume-se uma cidadã do mundo, já viveu em inúmeras culturas e vivenciou com pessoas completamente diferentes. Assume que gosta de estar em Portugal, mas admite que já não se sente bem sem poder viajar: «Sinto que a minha casa é aqui, alias, não há sítio de que tenha mais saudades do que estar em Portugal, mas eu sou cidadã do mundo, faz-me falta o mundo», garante.
Primeiro livro apresentado na Guarda
“No País do Silêncio” é o título do romance que retrata Portugal numa época de ditadura e que Rita Cruz decidiu editar porque queria oferecer um presente aos seus amigos e minha família.
«Como não tenho jeito para mais nada sem ser escrever, pensei em escrever um conto, mas o conto foi crescendo e tornou-se num romance», adianta. Rita Cruz também refere que um dos principais temas debatidos é a liberdade de expressão, pois sente que é um assunto que «merece ser debatido, recordado, e até mesmo aprendido pelas novas gerações». Por isso, o título do livro é baseado nessa mesma liberdade de expressão: «Este silêncio do título é o silêncio de quem cala porque há consequências em falar, por isso, sim, podemos dizer que um dos propósitos é esse», considera. A ação do livro desenrola-se numa pequena vila imaginária na Beira Alta, na Guarda e em Lisboa e no Porto.