A associação Frente Cívica denunciou o «festival de hipocrisia» no debate parlamentar sobre a eliminação de portagens nas ex-SCUT, considerando ter ofuscado a questão de fundo, mais premente, das rendas ruinosas pagas aos concessionários privados.
Um dia depois da aprovação do projeto de lei do PS, a Frente Cívica manifestou-se, numa nota à imprensa, para dizer que assistiu com «incredulidade e inquietação ao debate parlamentar» sobre a eliminação de portagens nestas autoestradas construídas no âmbito de Parcerias Público-Privadas rodoviárias, por não ter abordado as rendas pagas pelo Estado às concessionárias. «O Parlamento serviu-nos um festival de hipocrisia, que culminou na aprovação de uma medida cuidadosamente preparada para não beliscar as rendas pagas aos privados que capturaram o Estado no negócio das ex-SCUT. Uma Assembleia que passa horas a discutir 400 milhões de euros e não toca nos 800 milhões entregues todos os anos aos concessionários está totalmente enfeudada a estes interesses», sublinha o presidente da associação, Paulo Morais, citado no referido documento.
De acordo com a Frente Cívica, as Parcerias Público-Privadas (PPP) rodoviárias celebradas em Portugal desde meados dos anos 1990 e durante a primeira década do século XXI são um «negócio ruinoso, que deve ser extinto». «Se é verdade que a extinção das portagens pode representar uma diminuição de receitas públicas até, no máximo, 400 milhões de euros, é também certo que o Estado está a pagar indevidamente aos concessionários o dobro desse valor, ou seja, 800 milhões, todos os anos», é referido. Nesse sentido, a organização considera que a extinção deste negócio permitiria não só que os utentes das ex-SCUT deixassem de pagar portagens, como, ao mesmo tempo, ainda arrecadaria para o erário público 400 milhões de euros anuais. «Pela sua iniquidade e enorme peso orçamental, a reforma das PPP rodoviárias foi inscrita no plano de resgate da “troika”, em 2011, e alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia da República, que recomendou a sua revisão ou extinção», lembra-se.
Contudo, «mesmo depois de dois processos de renegociação – em 2010, por um Governo PS, e a partir de 2012, por um Governo PSD/CDS – estas concessões continuam a representar uma sangria de recursos públicos», realça a Frente Cívica, que lembra que o Orçamento do Estado para 2024 prevê um total de encargos com PPP rodoviárias da ordem dos 10.800 milhões de euros até ao final das concessões, em 2040, número que «contrasta com o valor real, calculado pelo Eurostat». A Frente Cívica defende que o Estado deve extinguir as PPP, indemnizando os concessionários no valor atualizado dos ativos, calculado pelo Eurostat. «Essa poupança deve refletir-se já no Orçamento de Estado para 2025, ou num eventual Orçamento retificativo para 2024, que deverá contemplar uma redução dos encargos brutos previstos, dos cerca de 1.200 milhões orçamentados, para valores a rondar os 400 milhões», defende a Frente Cívica.