Este jornal em que escrevo chegou às 1.000 edições! Numa altura em que saúdo tal longevidade e reitero os meus votos de continuidade na divulgação da região, não posso deixar de me referir a quem anda sempre com a região na boca.
Álvaro Amaro escrevia que, e cito, «(…) destaco inevitavelmente o progresso e uma mudança que fazem da Guarda de hoje uma cidade ambiciosa que se posiciona num eixo de afirmação da sua capitalidade». Ou seja, para Álvaro Amaro a Guarda de «hoje» é diferente da Guarda de ontem. A questão que se nos coloca é percebermos se essa diferença existe mesmo ou em que medida reside.
Podemos recorrer a vários critérios. Será pelo maior número de rotundas? Será pelas estátuas e estatuetas, de duvidosa qualidade e oportunidade artísticas? Será pelas festas e festarolas? Terá sido a abertura de uma ou outra empresa, sempre com um reduzido número de postos de trabalho? Ou, pelo contrário, deveremos contabilizar antes aquelas que encerram? Ou a perda progressiva de população e de juventude, devoradas pela emigração forçada e pelo inverno demográfico? Que, segundo notícias recentemente publicadas, poderão determinar a perda de um deputado para o distrito. Ou o cada vez maior atraso relativo para outras geografias, como é o caso da Covilhã, que subiu há uns meses atrás ao pódio do ensino superior com a atribuição do estatuto de “Centro Académico Clínico”, enquanto a Guarda ficou a ver navios?
Para dirimir este dilema sobre a metodologia destinada a perceber se Álvaro Amaro fala ou não verdade, há uma pergunta muito simples que qualquer cidadão pode e deve fazer: onde estão as verdadeiras obras ou realizações estruturantes da Guarda? Sim, as tais que foram anunciadas e nunca concretizadas, e que poderiam ter tornado – aí sim – a Guarda numa cidade ambiciosa.
Se esta pergunta não for suficiente, há uma ainda mais simples: quando Álvaro Amaro for embora, como ficará a Guarda? Como o filho do novo rico que fez vida faustosa enquanto durou o dinheiro que o pai lhe foi dando, ou como o filho daquele homem sábio e simples, que singrou na vida sem pedir nada a ninguém?
Como nem Álvaro Amaro tem resposta para este tipo de perguntas, vem agora com aquela velhinha conversa da descentralização. Isso mesmo, descentralização! Foi precisa uma vida de navegação pelos meandros da política, deixando um rasto de coisas efêmeras e de dívidas nem tanto, para que Álvaro Amaro descobrisse finalmente as virtudes da milagrosa panaceia em que se transformou agora tal conceito.
Quando um ditador está em dificuldades, costuma dizer-se que a melhor solução é inventar uma guerra. As guerras são patrióticas e galvanizantes, unem o que está desunido e põem de pé aquilo que já rasteja. Como não é ditador quem quer, mas sim quem pode, e Álvaro Amaro sempre pôde menos do que aquilo que queria, a Guarda não corre o risco de entrar em guerra. Pelo menos uma em que o sangue corra pelas valetas. Vai daí, faz-se uma guerrinha ao centralismo, descobrindo-se as benesses da, e cito novamente, «aproximação das decisões aos cidadãos», «promoção da coesão territorial», «reforço da solidariedade inter-regional», «melhoria da qualidade dos serviços prestados às populações», «racionalização dos recursos disponíveis» e outras tretas do mesmo quilate.
A experiência já me ensinou que acabaremos a ser brindados com novas taxas e taxinhas, tudo para o senhor Álvaro Amaro poder usar a Guarda como trampolim para voos mais altos. Perante isto, a minha natureza divide-se. Sou contra esta demagogia e populismo políticos que nos custam os olhos da cara e as mágoas do corpo. Mas ao mesmo tempo sinto-me tentado a fazer um acordo com o diabo só para não ter de aturar tanto circo. Por mim, se Álvaro Amaro quer mesmo ir para Bruxelas, até se consegue um peditório nacional que lhe pague o bilhete! Só de ida, naturalmente.