«Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo, golpe até ao osso, fome sem entretém, perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes, rocim engraxado, feira cabisbaixa, meu remorso, meu remorso de todos nós…»
(Alexandre O’Neill, “Portugal”, in Feira Cabisbaixa, 1965)
Ficaram para trás as idiotices dos decotes, das cadeiras e demais parvoíces que serviram e continuam a servir de amojo a muito português incauto. Os maganos da política continuam a querer fazer esquecer aos portugueses a vida dura e difícil que vão seguindo. Quimeras e falsos pechisbeques são atirados ao ar para gáudio da farrapeira que sorrateiramente vai bebendo em todas as pipas e faz da ágape o seu entretém favorito. Começou-se a confecionar a manta de burel que irá, assim o dizem, servir de cobertura ao frio gélido das nossas vidas. Uma manta curta! Falo-vos do Orçamento de Estado para 2024. Esse rol infindável de benesses para poucos e sacrifícios, muito sacrifícios. para milhões.
Do pouco que se sabe, nesta altura, como do que não se virá a saber no futuro, há algo de preocupante no pouco que se vai conhecendo. É mais um orçamento na linha dos orçamentos de Centeno e Leão, ou seja, orçamentos muito difusos, pouco transparentes e com múltiplos e variados alçapões. Chega-se ao desplante de se dizer que as célebres “cativações”, tão do gosto de Centeno, vão acabar. Para logo a seguir, de forma bacorejada, afirmarem que serão substituídas por outras formas de mercadejar. Quem foi que em abril deste ano, de 2023, seguindo as perspetivas do Banco de Portugal, anunciava, com toda a pompa e circunstância, um crescimento económico para 2024 de 2,4% nada em conformidade com o 1,5% agora anunciado? Convém termos presente que a situação económica na Alemanha, o “motor” da economia europeia entrou em recessão. A França para lá caminha. Nada surpreenderia que todas as previsões ditas de “contenção” agora conhecidas para Portugal não venham a sofrer uma enorme derrapagem.
E o que dizer da aproximação do Salário Mínimo ao salário médio quer no sector público, como no privado. Algo muito pouco motivador para uma classe média já sem qualquer poder de compra. E que dizer da valorização salarial de médicos, enfermeiros e restantes profissionais do Serviço Nacional de Saúde? E a recuperação do tempo de serviço dos professores? E as reduções dos impostos IRS, IVA e combustíveis? Ficou-se a saber, sempre com foguetório, que vai haver nalgumas autoestradas a redução do custo das portagens em cerca de 30%. Mas o que o Governo não disse é como vai ser recuperado esse valor para ser pago às concessionárias. Agora já se conhece a forma capciosa de dar por um lado e tirar por outro… Abandona-se o princípio do utilizador-pagador e recupera-se o do contribuinte-pagador. Quem não utiliza as autoestradas vai ter que pagar para os que a utilizam. Brilhante ideia do machacaz. Tudo, mas tudo para enganar totós!
Querem fazer-nos crer que é um «orçamento de contas certas». Mas afinal o que é isso de «contas certas»? A principal medida a ser tomada, e que não se vai verificar, era cortar nos serviços supérfluos, contratualização de escritórios de advogados, ajustes diretos e demais gordas peitas a amigalhaços, partidários e demais parasitas. Entretenimento é coisa que não vai faltar à corja farsola e pimpona. Mas já alguns de nós perceberam que este Governo não é apenas uma confraria, mas igualmente uma falperra de cordão.
Queremos mentiras novas, é que as velhas são um desrespeito à inteligência daqueles a quem são dirigidas!
“E o que dizer da aproximação do Salário Mínimo ao salário médio quer no sector público, como no privado. Algo muito pouco motivador para uma classe média já sem qualquer poder de compra.”