A “construção” da pedovia ou ciclovia paralela à Viceg, na Guarda, vai ser «reavaliada» após o concurso público lançado para a sua implementação ter sido anulado.
O projeto de nove quilómetros ao longo da Viceg é obtuso e é um erro. O investimento numa ciclovia ou num trilho para as pessoas poderem andar, correr ou passear deve obedecer a outro tipo de critérios espaciais e relação com o meio. O que sim faria sentido, seria apostar num percurso de envolvimento com a natureza, como aqui tantas vezes referi, seguindo as linhas de água, e em concreto o Rio Diz, desde a sua nascente junto ao Politécnico até ao Parque Urbano do Rio Diz, aproveitando todo o vale do Zambito e a encosta norte da cidade, requalificando a zona da feira, transformando em território de lazer toda a zona da antiga fábrica de lanifícios Tavares, onde deverá ser construído o centro de exposições, aproveitando a água, na sua dimensão lúdica, regressando, como tantas vezes defendi, à ideia de fazer um “museu da água” ou “museu dos lanifícios” ou “centro de interpretação da natureza”, dando espaço à botânica e à flora, construindo trilhos para bicicletas e pessoas, porque promovendo a qualidade ambiental, estaremos a promover a qualidade de vida das pessoas, a saúde pública e a contribuir para uma cidade muito mais viva e agradável. Mais bonita, moderna e amiga dos seus habitantes. Não basta falar do “bom ar da Guarda” é preciso promover e qualificar os espaços de natureza e implementar os percursos pedestres, ciclovias e de outras utilizações de lazer. Isto é cultura e isto é dar vida à cidade.
A Guarda gastou no ano passado cerca de 900 mil euros na requalificação das margens do rio Noéme, que as chuvas intensas de novembro destruíram ou estragaram parcialmente. Numa extensão excessiva e cuja manutenção vai continuar a custar muito dinheiro. Numa intervenção que valorizou a área envolvente ao rio, que permitirá a melhor relação com o campo, porém, não foi a melhor opção. Essa teria sido, obviamente, a requalificação da zona envolvente ao Rio Diz.
«O lazer, eis a maior alegria e a mais bela conquista do homem», disse um dia o escritor Rémy de Gourmont. É essa conquista que tem de ser alcançada nas nossa vilas e cidades; é essa alegria que tem de ser vivenciada nos lugares do nosso território. Porque na cidade que há muito investe na cultura, que ambiciona a capitalidade cultural, também tem de promover a urbanidade e o meio-ambiente, os espaços de lazer e de natureza, pois, como nos ensinou Sophia de Mello Breyner, a cultura não existe para enfeitar a vida, mas para a transformar. E nessa dimensão cultural, nessa ambição comum de darmos vida aos territórios, a pegada ecológica e o lazer têm de ser mais efetivos. Uma ciclovia ou um trilho para caminhadas não tem de ser, não deve ser, um apêndice de uma estrada, e menos ainda de uma circunvalação (inacabada, por sinal) que também é precisa em prol da mobilidade das pessoas.
Outrossim, seria fazer uma ciclovia que ligue as escolas, em especial a Carolina Beatriz Ângelo com a de S. Miguel (aproveitando os mil metros de ciclovia junto à Avenida de S. Miguel e o viaduto sobre a Viceg), com ligação ao Parque Urbano do Rio Diz e aos trilhos e passadiços que deveriam nascer em toda a encosta até à Catraia da Alegria e aos «jardins» frondosos que devemos reivindicar junto ao Rio Diz (como muito bem escreve a Elsa Salzedas na página 8 deste jornal). Intervir numa cidade é construir o futuro. Os recursos são escassos e, até por isso, muito mais importante do que adaptar o que está bem, é aproveitar e intervir no que está mal.