Os charlatães

Escrito por António Ferreira

“As contas totais das promessas nunca são apresentadas e ninguém sabe, por exemplo, o custo da recuperação das carreiras dos professores. O que se sabe ao certo é que o dinheiro necessário para cumprir essas promessas tem sempre as mesmas origens.”

Como a campanha eleitoral já começou há muito, vamos percebendo para onde e como nos querem levar os partidos. Não vêm todos ao mesmo: uns querem governar, outros querem satisfazer os interesses do seu eleitorado, outros querem ser indispensáveis a quem quer ser poder. O PPM é diferente, apenas está nisto para justificar a utilização da sigla “AD”.
De acordo com o que pretendem, podemos classificar as propostas que apresentam de acordo com o respetivo grau de charlatanice. Este é muito elevado quando um partido que quer mesmo governar acena com um “choque fiscal”, como o fizeram Durão Barroso e Passos Coelho para logo que chegaram ao poder aumentarem hipocritamente os impostos com a justificação, também hipócrita, de que “isto” estava pior do que eles pensavam. Será de valor médio no caso da Iniciativa Liberal, que não pensa ganhar as eleições, mas tem a ambição de vir a ser necessária para apoiar um governo minoritário da AD. Será de valor reduzido no caso da esquerda radical, que querendo baixar o IRS nos escalões mais baixos pretende aumentar a progressividade do sistema. Mesmo assim, há muito de charlatanice nas suas propostas fiscais, como a do aumento extraordinário de impostos sobre os lucros da banca, que o Chega também cavalga, impondo uma progressividade no IRC para que o sistema não está desenhado e que viola a Constituição e a lógica: se subimos a taxa de IRC quando sobem as taxas de juros em benefício dos bancos, vamos também descê-la quando as taxas baixarem? Não estamos também a esquecer que quando os lucros sobem o IRC sobe na mesmo proporção, mesmo não mexendo na taxa?
Outra charlatanice é a das promessas de valorização salarial no Estado. Os professores vão recuperar integralmente as carreiras, na PSP e na GNR (e no corpo de guardas prisionais) vai ser aplicado o mesmo suplemento de missão que foi concedido à PJ, independentemente da complexidade e especialização ou risco das respetivas funções, os médicos vão trabalhar menos e ganhar mais 30% e os restantes funcionários e agentes públicos, que não merecem tratamento de enteados, como por exemplo enfermeiros e funcionários judiciais, vão igualmente ver valorizadas carreiras e remunerações. Não esqueçamos, entretanto, que em muitas carreiras da função pública há falta de funcionários e a contratação dos necessários vai aumentar igualmente a despesa. Se forem pagos mais €700,00 por mês a cada agente da PSP ou a cada soldado da GNR teremos um aumento da despesa anual superior a 400 milhões de euros. As contas totais das promessas nunca são apresentadas e ninguém sabe, por exemplo, o custo da recuperação das carreiras dos professores. O que se sabe ao certo é que o dinheiro necessário para cumprir essas promessas tem sempre as mesmas origens.
Quanto aos contribuintes do sector privado, que são quem tendencialmente paga tudo isto, têm prometida pelo PS e pelo PSD uma diminuição de impostos (um choque fiscal mais suave, digamos). Isso significa que vai haver menos dinheiro para o cumprimento das promessas e que só é possível cumpri-las com mais endividamento ou com uma subida da receita fiscal que resultar de um inesperado aumento da produtividade geral do país. Até pode acontecer que as empresas consigam acomodar facilmente o aumento do salário mínimo para €820,00 (o PCP quer €1.000,00) e o salário médio na proporção desse aumento, mas historicamente nunca aconteceu e nada faz prever que agora venha a acontecer.
Quem ouve gerentes de pequenas e médias empresas, que são quem emprega a esmagadora maioria dos trabalhadores por conta de outrem, sabe bem das dificuldades por que passam e o que vai acontecer a muitas, mesmo que lhes baixem os impostos. Ou quem ganha as eleições vai utilizar muito bem os dinheiros do PRR para aumentar a produtividade geral do país, ou vai ter de pagar as promessas com banha da cobra. Outra vez.

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António Ferreira

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