O ilusionismo da coesão territorial

Escrito por Efigénia Marques

Vivemos do faz de conta, daquilo que parece, mas não é, das ações inconsequentes, do logro e do embuste político. Se o Dr. Costa quisesse mesmo fazer alguma coisa com esta parte desprezada do país não extinguia a Unidade de Missão para a Valorização do Interior, que de tantas medidas que preconizou

Falar sobre este tema é malhar em ferro frio, mas, como diz o outro, “fala fala que alguma coisa lá há-de ficar”. O governo reuniu na semana passada em Castelo Branco e lá se desdobrou nas rotineiras visitas a empresas, Universidade e Politécnico, obrigatoriamente intercaladas comos habituais almoços enriquecidos com os melhores vinhos e produtos da região. A ideia foi mostrar ao país que a coesão territorial e a proximidade estão na lista de prioridades do executivo. Para quem se contenta com “poucochinho”, a iniciativa é melhor que nada, pois sempre traz um olhar para esta região do país, que é falada e ouvida alguns minutos nas notícias do dia.
Mas o que confrange é que, ao fim de dois dias deste saudável rodopio de ministros e secretários de Estado fora de Lisboa, nenhum português tenha conhecido uma única medida anunciada de valorização do interior. Uma vez mais esta iniciativa foi um fogacho, esfumando-se logo que os governantes regressaram à capital da Pátria. Acredito que tenham sido discutidas questões importantes para estes territórios e que os diagnósticos, quase todos já com “barbas brancas”, tivessem ocupado parte do roteiro. A verdade é que as terapias e as decisões ficaram na gaveta, como quase sempre.
Enquanto se degrada de forma muito veloz a possibilidade de ainda se regenerar a tempo o interior de Portugal, continuamos a fingir que se faz alguma coisa para que tudo fique na mesma. Vivemos do faz de conta, daquilo que parece, mas não é, das ações inconsequentes, do logro e do embuste político. Se o Dr. Costa quisesse mesmo fazer alguma coisa com esta parte desprezada do país não extinguia a Unidade de Missão para a Valorização do Interior, que de tantas medidas que preconizou (eram 164!!!) lhe causou mais problemas de “inconseguimentos” e falhanços do que de concretizações e sucessos, cedo se percebendo que daquela agenda de soluções quase nada pôs ou iria pôr em prática.
E também não retiraria da orgânica do Governo a Secretaria de Estado da Agricultura, uma área que é crucial para a sobrevivência das zonas rurais e que se finou por razões que são difíceis de entender, a não ser pela dificuldade em recrutar no mercado figuras com reconhecida capacidade técnica e politica que sejam capazes de responder sem “meter o pé na poça” ao questionário das 36 perguntas que o hábil chefe do Governo engendrou para se desresponsabilizar das suas inenarráveis más escolhas de governantes que quer que consigo trabalhem. Deixemo-nos de coisas. Ou o país político age com rapidez, com coragem e com uma estratégia a 20 anos da qual não se desvie, ou o interior não conseguirá reerguer-se. Entre muitas outras medidas concretas cuja implementação venho defendendo (e escrevendo) e que numa das próximas crónicas aqui reproduzirei, não me conformo que as ajudas do Governo às Câmaras que se candidataram a acolher o povo ucraniano na sequência da guerra, tenham beneficiado maioritariamente municípios das áreas metropolitanas e do litoral, deixando de fora autarquias das regiões económica e demograficamente mais “deprimidas”, num centralismo e num servilismo aos poderes mais altos que vai deixando o Portugal profundo em cacos.
Temos de continuar a acreditar no nosso povo, mas como já 14% dos bebés nascidos em Portugal são filhos de mães de outras nacionalidades, é mesmo premente instituir políticas de apoio à imigração que tornem atrativo o nosso país e em particular as regiões de baixa densidade, para onde devem ser canalizadas a maioria das ajudas públicas. O maior partido da oposição propôs há dias no Parlamento (e muito bem) a criação de um programa nacional para atrair imigrantes. Mas em vez da questão ser discutida a sério e com sentido de Estado, vingou – como em muitas outras matérias estruturantes – o tacticismo eleitoral, o preconceito, o “soundbyte” e, sobretudo, a irresponsável incapacidade de entendimento e de compromisso dos demais partidos. Assim, é difícil fazer crescer e transformar Portugal, que só por milagre deixará de continuar de mão estendida à espera das “esmolas” de uma Europa que um dia o vai deixar sem nada na mão.

* Advogado, presidente da Assembleia Distrital do PSD Guarda e antigo deputado do PSD na Assembleia da República eleito pela Guarda

Sobre o autor

Efigénia Marques

Leave a Reply