O 25 de Abril na Guarda

” O tenente Anastácio que comandou o quartel da Guarda no dia 25 de Abril de 1974, substituindo o Capitão Valente que foi “guardar” a fronteira do país em Vilar Formoso”

1. «Esta é a madrugada que eu esperava», diria Sophia de Mello Breyner Andresen sobre uma revolução que tantos esperaram durante 48 anos. O 25 de Abril cumpriu a maioria dos pressupostos que uma revolução encerra: a transformação social, cultural e política da sociedade, e acabou com a guerra colonial. E comemorar Abril é, precisamente, recordar o ponto de partida, em 1974, e contemplar um país diferente, para melhor. Portugal é hoje um país com um regime Democrático consolidado, onde a Liberdade é um dado adquirido e onde as pessoas vivem com muito mais dignidade e qualidade de vida. E quando ouvimos que «antigamente era muito melhor», temos de recordar que não, não era: Portugal era um país pobre, atrasado, oprimido, triste e sem futuro. Por isso, a Revolução merece ser celebrada, porque «agora ninguém mais cerra/as portas que Abril abriu!» (Ary dos Santos). Mas temos de estar vigilantes… sempre!
2. Há 50 anos a liberdade ganhou à censura, hoje é a Democracia que vai empobrecendo perante novas formas de admoestação e repressão ao direito a informar e a ser informado. A imprensa vive dificuldades extremas, que têm mais a ver com a falta de mercado do que com a fuga de leitores para novos suportes e, em consequência, vai sendo cada vez mais difícil a prática de jornalismo – determinante para a liberdade e a qualidade da Democracia… A Imprensa foi determinante na Revolução (foi na rádio que se transmitiram as primeiras mensagens revolucionárias) e é essencial na vida da Democracia.
Os governos e as autarquias têm de fazer escolhas e perceber a importância de apoiar a comunicação social e enquanto comemoramos o 50º Aniversário da Revolução dos Cravos também não podemos deixar de salientar o papel que as rádios locais e a imprensa regional também tiveram e têm na consolidação da democracia e da liberdade.
3. Foram os militares que fizeram a Revolução. Foram os “capitães de Abril” que ditaram o fim do fascismo em Portugal. E são os militares que merecem o aplauso e a homenagem 50 anos depois. No país, como na Guarda. Não basta recordar o heroísmo de Salgueiro Maia, e depois esquecermos os riscos dos muitos que arriscaram a sua vida ao deporem o regime em todos os quarteis onde as Forças Armadas se revoltaram.
Na Guarda, onde, no RI12, os jovens oficiais se amotinaram e contribuíram para a execução do golpe de estado – por isso, e se mais razões não houvesse, é inaceitável que os militares que há 50 anos estavam no RI12 (os oficiais, os sargentos e os soldados) não estejam entre os convidados para a Sessão Solene que a Câmara da Guarda, e bem, organizou para comemorar o 50º Aniversário da Revolução. Se homenagear o Capitão Valente é um ato de justiça elementar, deixar de fora os seus camaradas, os que com ele partilharam sonhos e riscos, é incompreensível.
4. À Guarda a Revolução chegou mais tarde. As notícias que iam chegando de Lisboa não impactaram de imediato na cidade beirã. À hora de almoço o Governador Civil continuava a ser Andrade Pereira e no quartel o Coronel António José Ribeiro continuava a ser o comandante do Regimento de Infantaria 12, coadjuvado pelo Segundo Comandante, o Tenente-Coronel António Jorge Teixeira.
Foi depois do almoço que a Revolução entrou pelos muros do quartel. O Capitão Monteiro Valente, seguindo as indicações do Movimento das Forças Armadas, irrompeu pelo bar dos oficiais, de arma em riste, e com um grito de rebelião deu ordem de prisão ao Comandante tomando o comando do RI12. E quando o segundo comandante se levantou para ripostar à ordem, o capitão Valente disparou para o chão e gritou que a bala seguinte lhe seria dirigida se este não se sentasse (foi o único tiro que houve na Guarda no dia 25 de Abril de 1974, e um dos poucos que houve nesse dia de Revolução em Portugal). Os jovens oficiais rodeavam Monteiro Valente (nomeadamente o tenente Anastácio, que comandou o quartel da Guarda no dia 25 de Abril de 1974, substituindo o Capitão Valente que foi “guardar” a fronteira do país em Vilar Formoso. O até então comandante e o segundo comandante rederam-se e seguiriam depois, presos, para um quarto do Hotel Turismo onde ficaram detidos. Ao que “parece” é preciso escrever a história do dia 25 de Abril na Guarda e na região. Nesta edição queremos contribuir para isso revelando alguns pormenores até agora desconhecidos ou pouco divulgados.
5. 50 Anos depois, os então jovens militares mereciam, todos, ser recordados e homenageados, por terem estado do lado certo da história. Ou, como nos recordou Luís Anastácio, eles arriscaram a vida e outros fazem agora a festa. Outros que não sabemos por onde andavam, mas sabemos que não estavam ali…

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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1 comentário

  • Muito bom artigo quero realçar a sua última frase que diz quase tudo sobre o estado de espírito da sociedade portuguesa