E, mais uma vez, o engodo volta a funcionar. São tantos os casos de assalto ao pote nos vários poderes nacionais e locais, que nos perguntamos se o reino não está mesmo podre. Estudos e prémios há-os aos milhares. Se começarmos a puxar o fio do novelo facilmente se descobrirá a tramoia montada para sacar milhões aos portugueses, sempre com a modalidade ladra dos ajustes diretos. De vez em quando surgem na comunicação social estudos, consultas e galardões, e questionamo-nos como é possível existir tanto lixo. Sim, é de lixo que se fala.
Recentemente, apesar de a comunicação social nada ter dito sobre o assunto, ficou-se a saber que uma associação, a INTEC, criada em 2007 por um casal de professores do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, conseguiu convencer 11 autarquias “mecenas” a desembolsar, cada uma delas, 12.500 euros para participarem num hipotético “ranking” com o objetivo de «dignificar» as melhores políticas públicas desenvolvidas pelos autarcas portugueses. O título da iniciativa era sugestivo: “Prémios – Melhores Municípios para Viver”. Com tal título, e dada a confrangedora patetice dos autarcas, o montante pedido volatilizou-se nos bolsos dos promotores do estudo como ajuste direto, com um objetivo claro, o da glorificação pessoal. No meio da tramoia foi garantido aos participantes que nunca sairiam de mãos “a abanar” do empreendimento. Estava lançada a isca. Segundo os promotores do engodo, na pior das hipóteses as autarquias em causa obteriam uma menção honrosa e, na melhor, uma mão-cheia de “taças” para currículo político.
A 3 de novembro de 2022, a INTEC organizou uma gala para distribuição dos galardões, que teve como parceiros o “Jornal de Notícias” e a Universidade de Coimbra. O estudo em causa, que terá supostamente redundado nos rankings e consequentemente na atribuição dos galardões, não foi ainda divulgado. Na gala, abrilhantada pelos sorrisos de vários autarcas, houve prémios para todos os gostos, por serem 10 as categorias avaliadas, com os três primeiros classificados a merecem distinção, e ainda um ranking global elencando os cinco melhores municípios (não houve últimos), ponderados os vários indicadores. Contudo, tendo em conta que Portugal tem 308 municípios, esperar-se-iam muitos premiados, uma vez que, contas feitas, contabilizaram-se 38 galardões, incluindo três menções honrosas excecionalmente atribuídas pelo INTEC. Mas não foi o que aconteceu. Na verdade, como disse, apenas 14 municípios foram distinguidos.
Esta concentração de prémios emparelha com o facto de, por coincidência, grande parte dos vencedores serem “mecenas” dos próprios galardões que receberam. Numa consulta detalhada no Portal Base, o INTEC celebrou, entre maio e novembro deste ano, pelo menos 11 contratos com municípios para a elaboração de estudos e para a candidatura dos prémios “Melhores Municípios para Viver”. Embora até possam ser mais – uma vez que, por vezes, existe um desfasamento de vários meses entre a assinatura e a publicitação no Portal Base, detetou-se a celebração de contratos com os municípios de Lagoa, Caminha, Bragança e Pombal que ocuparam o top 5. No total, o INTEC encaixou 137.500 euros, a que acresce IVA. Nesta lista de 11 municípios, todos receberam galardões. Isto é, ninguém que tenha pago à INTEC ficou de mãos a abanar. No caso do município de Caminha – que, repita-se, ficou em segundo no ranking global e foi distinguido em cinco categorias – o contrato entre o presidente da autarquia, Rui Lages – que substituiu o ex-secretário de Estado-adjunto do primeiro-ministro, Miguel Alves – e a presidente do INTEC, Patrícia Palma, foi assinado no próprio dia da gala, 3 de novembro. E o contrato especifica que se destina à candidatura ao prémio. Já no contrato do município de Lagoa, por sua vez, não surge a garantia de que ganhará prémios, mas nas fases do contrato ficou expresso que os resultados seriam divulgados num órgão de comunicação social nacional de grande tiragem, que acabou por ser o “Jornal de Notícias”. Em todo o caso, em comum em todos os contratos entre INTEC e municípios no Portal Base, está a ausência dos cadernos de encargos, ignorando-se assim as contrapartidas fixadas pelos pagamentos.
Este é um exemplo claro da parolice e da chico-espertice que imperam no nosso país. Uma verdadeira sociedade amigável de palmadinhas nas costas. À custa dos nossos impostos, claro.
Negociatas, inutilidades, taças e palmadinhas
“Recentemente, apesar de a comunicação social nada ter dito sobre o assunto, ficou-se a saber que uma associação, a INTEC, criada em 2007 por um casal de professores do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, conseguiu convencer 11 autarquias “mecenas” a desembolsar, cada uma delas, 12.500 euros para participarem num hipotético “ranking” com o objetivo de «dignificar» as melhores políticas públicas desenvolvidas pelos autarcas portugueses. “