Com o habitual otimismo, o Presidente da República disse na sua chegada a Roma que «o que for bom para Espanha é bom para Portugal». E não era preciso Marcel Rebelo de Sousa dizê-lo, é um facto de fácil perceção para todos. E mais ainda para os raianos, os que vivemos perto da fonteira e bem sabemos das pequenas trocas comerciais, das vendas extraordinárias na feira de Vilar Formoso (ou de Valença, ou de Miranda, ou de Elvas, etc), da presença constante de “nuestros hermanos” nos restaurantes fronteiriços, as “pontes” passadas nas nossas vilas e cidades, enfim, o turismo e comércio com espanhóis é essencial para a nossa vida económica.
Houve um tempo em que a peseta valia 50 centavos e Espanha ainda vivia agrilhoada pelos caudilhos de Franco, e nós já respirávamos a liberdade de Abril. Desde então, Espanha foi sempre mais ambiciosa e determinada. Entrou para a Europa connosco, mas soube aproveitar muito melhor os fundos comunitários. Modernizou-se, descentralizou-se e afirmou-se como a oitava economia mundial (entretanto ultrapassada pelo Brasil). Com as autonomias desenvolveu as médias cidades e alimentou as nacionalidades – já não os etarras bascos, mas os independentistas catalães que agora atrapalham a retoma da “grande Espanha”. E é a nova geração de políticos, jovens e sem bom-senso, incapazes de fazer pontes e aproximar diferenças, que em quatro anos levaram o país para quatro eleições “gerais”. Em vez de uma federação de nações escolhem a soberba espanholista, contra as nações e a riqueza cultural da diversidade que Isabel soube unificar, incentivaram a deriva opressiva, ostracizaram e vexaram os povos da Espanha periférica. Quando o país vizinho precisava de gente que pensasse o futuro e projetasse a Península Ibérica na Europa, temos os movimentos retrógrados como o VOX a crescer no seu atavismo centralista e misógino. Espanha, como nunca, precisa de gente “maior”, mais experiente e serena. Precisa de Savater, Castellet ou Bernardo Atxaga, precisa dos pensadores da Ibéria moderna e dos moderados dos anos 80 e 90.
Mais umas eleições, e tudo igual. Agora com um entendimento “progressista” assente em pressupostos frágeis, num país com cinco milhões de desempregados e um crescimento anémico. Se antes Sanchez não conseguia dormir se Iglésias chegasse ao governo, agora, com menos votos e menos deputados, no PSOE e no Podemos entenderam-se numa hora e vão viver juntos. Dizem! Mas se Iglésias ganhou, perdendo, e vai chegar ao governo no imediato; se o VOX duplicou, se o PP recupera e fica em silêncio à espera da queda dos outros e se o Ciudadanos se “desplumou”, são os pequenos partidos regionais que vão ocupar o palco da vida política espanhola. Sanchez vai governar com os comunistas, mas vai ter de negociar e assumir reivindicações do PNV basco, dos catalães moderados, dos canários, do partido da Cantábria, do BNG galego, dos navarros e do “Teruel Existe”. Porque a “España vaciada”, esquecida e sem gente, despovoada e desertificada, organizou-se e votou contra o regime, elegeu deputados – poucos, porque são poucos – e aceita aprovar o governo de Sanchez se as suas províncias receberem o que pedem. Lembram-se do deputado “limiano”? Pois, Espanha vai ser governada assim, debaixo dos humores e das exigências de pequenos partidos regionalistas. Como em Portugal, quando Guterres deu a Ponte de Lima o que Daniel Capelo exigia em troca do voto, Madrid vai ter de pagar às regiões mais pobres o que os seus eleitos exigirem. “Teruel Existe” porque a província de Teruel foi completamente abandonada e ostracizada pela Espanha moderna. Oxalá tivéssemos um “Guarda «Existe”, ou “Covilhã Existe”, ou “Pinhel Existe”, ou “Trancoso Existe”, etc, porque a Beira existe, mas não parece. E o que temos são deputados que acham bem que o interior pague portagens e fique a ver os aviões aterrar em Lisboa.
“Guarda Existe”
Oxalá tivéssemos um “Guarda Existe” ou “Covilhã Existe” ou “Pinhel Existe” ou “Trancoso Existe”