De visita à Guarda, um jovem casal experimentou empurrar o carrinho do seu bebé num passeio pelas ruas da cidade. Na Av. dos Bombeiros Voluntários Egitanienses começaram por ter de atravessar diversas vezes a rua para não serem abalroados pelos transeuntes, que com eles se cruzavam, e para não abalroarem os carros por ali estacionados, antes de chegar ao princípio da Rua do Comércio. A meio da Alves Roçadas acabaram por desistir do passeio. As rodas do carrinho do bebé resistiam, excessivamente, a passar por cima das pedras irregulares dos passeios e da estrada Nem pai, mãe e, muito menos, bebé tinham visto antes uma coisa assim.
Indignados, acabaram por concluir que quem tenha limitações motoras, ou ande em cadeira de rodas, dificilmente se aventurará a andar nesta cidade. Claro que, aqui chegados na conversa, para não deixar que os guardenses ficassem assim tão mal vistos, lá tive que tentar desculpar tamanha anomalia urbana. “Há uns anos falaram em remodelar isto, mas como havia o problema do Hotel Turismo, do Hospital, da remodelação da Central de Camionagem, do “emblema” da cidade, das Feiras, Ibérica de Turismo e Farta, da Passagem de Ano, do Solar dos Vinhos, das rotundas, excessivamente limpas e escorreitas, que era preciso preencher, dos Passadiços, da Casa da Legião e mais não sei o quê para resolver, acabaram por não o fazer”. “Mas, ao menos, resolveram isso tudo?” “Tudo, tudo não. Falta resolver o problema do Hotel Turismo, do Hospital (que é eterno e, por isso, está sempre à mão) da remodelação da Central de Camionagem, do ‘emblema’ da cidade, das Feiras, Ibérica de Turismo e Farta, da Passagem de Ano, das rotundas limpas e escorreitas, que era preciso preencher, dos Passadiços, da Casa da Legião e mais não sei o quê”. “Como assim?” “Então, enquanto andarmos entretidos com estes velhos problemas, e, à custa deles, de mais dois ou três que arranjarmos, ninguém – além dos próprios – se irá preocupar com quem não possa passear pela cidade.
Se tivéssemos o Hotel Turismo, por exemplo, haveria muitos turistas e já valia a pena requalificar as ruas da cidade. Agora, assim, não”. “Mas não há os turistas que vêm pelos Passadiços?” “Lá está, esses não precisam da cidade para passear. Nos Passadiços o piso até é macio e bem comportado. Embora, se não fosse, também não haveria de ser daí que mais mal viria ao mundo: ninguém se põe a ‘fazer’ Passadiços com carrinhos de bebé ou em cadeiras de rodas”. Por isso, pouco nos tem importado o facto de a cidade estar uma balbúrdia. Pouco nos tem importado que, por aqui, o problema da mobilidade se restrinja ao dos comboios parados. Pouco nos tem importado que a estação de Camionagem pareça do terceiro mundo de antigamente. Além do estacionamento para o carro, das feiras, do Natal, Carnaval, da coleção de mamarrachos distribuída pelas principais rotundas e, mais recentemente, parece, do “multiusos”, poucas coisas nos importam. E, quando chegar a hora de nos importarmos com mais qualquer coisinha, em vez de nos queixarmos deste quintal sujo e desarrumado, em que a cidade se transformou, ainda nos havemos de importar primeiro com outra coisinha qualquer.