Cada vez mais em área(s) como o Direito e Tecnologia os (juris)peritos carecem de aprovar articulados vigentes sob a forma de atitudes pensantes, mais conscientes do seu papel social neste século XXI data-driven, menos axiológico-normativas, cautelosamente progressistas e, de sobremodo relevante, distantes do atual estado de arte plasmado em alguns escritos das Faculdades de Direito. Estas traduzem ora – pretensiosismos à parte – o viés na transmissão de saberes, em estilo aula-conferência, de entendimentos monodisciplinares acerca daquilo que imaginam ser o espelho draconiano de uma Engenharia – curiosa e convenientemente, estimulante de vários tratos humanistas até então por despertar e de tantos outros a esconder. Neste Dom Quixotismo contra determinados ventos jusfundamentais setoriais, reconheço ser o amigo Sancho Pança que avista o horizonte de um anoitecer inconstitucional como este que não pode sem mais continuar a ser aplicado no ordenamento jurídico português em matérias de uso da Inteligência Artificial (IA) sobre aquilo que é ou deixa de ser, a la teoria do Direito dos Livros, a tomada de decisões individuais e exclusivamente automatizadas.
Ajuízo já – quase que num enjeito do alter ego heteronómico da Ode Triunfal de Álvaro de Campos –, poder circunscrever a IA na qualidade de engenharia que se dedica ao desenvolvimento de entidades artificiais aptas à concretização auxiliar ou substitutiva de tarefas científicas até então tão-só só consignadas à inteligência humana. Nesse sentido, entendi, com o maior dos respeito e consideração, submeter a apreciação da constitucionalidade desta matéria aos Exmos. Srs. Presidente da República e Provedora de Justiça, diligenciando adicionalmente dar conhecimento aos demais órgãos de soberania (via entrega de correspondência CTT destas reclamações com data de dia 18 de agosto de 2021). Ensejo, com esta iniciativa, que seja determinada a inconstitucionalidade abstrata sucessiva e por omissão do regime tecnofóbico sobre a proteção de dados pessoais quando aplicável à IA, este reproduzido, aliás, nos números 1 e 2 do artigo 9.º da Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital. Porque, se estes normativos estão hoje em vigor, não nos permitirão “continuar a avançar”, obstaculizando o desenvolvimento e a aplicação destas novas tecnologias disruptivas. É indubitável a desconformidade diante o enunciado princípio lógico da legalidade sancionatória de mera ordenação social por omissão. Se aplicadas as avultadas coimas correspondentes, irrazoável ou destruidor será ponderado diante o dinamismo da maioria do tecido empresarial PME ou até mesmo das Gigantes tecnológicas. “Sim, é possível” ainda emitir recomendações para a alteração, revogação, ou até mesmo sugestões para a elaboração de uma nova legislação – mais coadunável, é certo – em matérias da Ciência dos (Mega)dados. A este respeito, foram várias as cataduras erróneas, de pendor técnico-científico, reportadas para o devido efeito ao Exmo. Presidente da República Portuguesa e à Provedora de Justiça, com base nas quais o Tribunal Constitucional poderá decretar a desproporcionalidade sucessiva e omissiva por mim fundamentadas em consonância com o consagrado nos números 1 dos artigos 281º e 283º da Constituição da República Portuguesa (CRP), respetivamente.
Assim, cristalizo presentemente em mim a idiossincrasia segundo a qual o valor adequado para uma efetiva proteção dos consumidores ou internautas a preitear exigirá neste âmbito um método de interpretação objetiva (não totalmente metafísico) que investigue conexões de sentido na prática ainda coexistentes com a dignidade da pessoa humana (ou, quiçá, artificial). Porque no mundo de entidades paralelas, vivenciado há décadas através da IA Distribuída, também a ideia de proporcionalidade pode, deve ou até tem de deixar de ser conatural só às relações entre humanos e dar mais espaço ao núcleo pessoal da iniciativa privada, da liberdade de promover uma atividade económica – corolário de uma autonomia reforçada esta consagrada no número 1 do artigo 61º da CRP. Sucede que, por de entre as linhas de investigação pelas quais tenho envidado esforços, indago cada vez mais que uma tutela adaptada a esta área só poderá ser reforçada casuística e sectorialmente com recurso a saberes mais polímatos, a melhor ver, da Engenharia Informática, da Neurociência e da Psicologia da Tomada de Decisão, entre outros, que não só a poesia jurídica – genérica e abstrata e, a fim ao cabo, inexequível.
Pelo dito, nesta égide, para bom entendedor, meia palavra bastará. Também aqui, “mais e melhor” legislador, precisa-se, porque as Regiões das Beiras e Serra da Estrela também continuarão a lutar por ter uma palavra capital a dizer em ambientes Big Data. E n’O INTERIOR – terminologia empregue e transcrita em sentido polissémico, enalteça-se – também se pode(rá) investir neste novo mundo de tecnologias e infraestruturas de ponta. A melhor aclamar, nunca foi, é ou serão a terra onde judas perdeu as botas da Ciência, Tecnologia e da Sociedade da Informação. Esta é a ocasião que, a meu modesto perspetivar, a região do Interior do país não pode desaproveitar enquanto vanguardista na área da investigação científica, desenvolvimento de projetos tecnológicos e, ademais, quanto à redação de pareceres para melhores iniciativas legislativas em sede própria da Engenharia do Direito da IA. A fraca densidade populacional e o tendencial ou comparativo desinvestimento (ora, tecnológico) em áreas geográficas como esta são fenómenos que têm de ser pelejados e contrariados o quanto antes, sem qualquer interferência de parcialidades concernentes a ideologias político-partidárias.
Diogo Morgado Rebelo, investigador júnior em Direito da Inteligência Artificial no Departamento E.TEC, Centro de Investigação em Justiça e Governação (JUSGOV) da Escola de Direito da Universidade do Minho